Festival Internacional de Marionetas do Porto: a noite em que chorámos três vezes no Teatro
O Festival Internacional de Marionetas do Porto (FIMP) recebeu, no Teatro Rivoli, na noite de quarta-feira três espetáculos de linguagens diversas, onde o denominador comum era fazer chorar o público.
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Logo à entrada no Foyer do Teatro municipal Rivoli, no Porto, algo parecia inusitado eram oferecidos ao público: uma goma para adoçar a vida amarga e um lenço de papel porque iríamos todos chorar. A advertência vinha dos intérpretes de A Tarumba sobre a sua performance "Crankies de fazer chorar as pedras da calçada".
Ainda um pouco perdidos a deambular pelo espaço, os visitantes eram convidados a ir para o quadrado central do Foyer e dançar. É então que começa um impresssionante crankie sobre o tema do mexicano Pedro Infante "Soy infeliz". Perante a fatídica letra "Soy infeliz, Si porque tú no me quieres, Piensas que yo he de morir, Que me sirvan otro trago, Cantinero yo lo pago, Pa' calmar este sufrir" foram passando imagens de mulheres perversas, adulteras, capazes de derreter qualquer macho ou esmagá-lo com o seu poder, assim como outras imganes mais referentes ao universo mexicano com Catrinas. Perante este desfilar etnográfico o público ia sorrindo maravilhado com a associação de imagens. Mas, o melhor ainda estava por chegar. Perante uma audiência, maioritariamente nacional, foi exibido o crankie dedicado ao tema "Óculos de sol", de Natércia Barreto. O público foi também instigado a cantar de viva voz. A Tarumba pôs os visitantes do FIMP a comerem gomas e a gritar: "Pois eu sei que te hei-de encontrar, talvez deitado à beira-mar, com outra ao lado, e eu vou passar a tarde a chorar", enquanto limpavam as lágrimas de riso. Uma solução simples, mas muito bem executada.
Cenas sexuais numa toalha vichy
No segundo momento da noite, estava reservado, para o Pequeno Auditório do Rivoli, o espetáculo "Summer of ´69" do belga TOF Théatre. Um delírio poético com sabor a limonada morna e cheiro a protetor solar vintage. Uma marioneta em escala humana relembra através de um projetos o verão da sua juventude. Aqui duas marionetas - meio humanas, meio desarticuladas - tentam reviver o verão da sua juventude, mas o tempo, esse vilão sem piedade, já lhes roubou o jeito, um humor físico e ternura desajeitada com recurso a muitas cenas sexuais, entre os dois personagens, cuja ação está quase sempre a ser interrompida pela polícia, vendedores de gelados e até uma vaca que insiste em atrapalhar os seus planos.
A cenografia é simples: uma toalha Vichy, um cesto e um sol que nunca se põe, talvez porque é apenas um foco de luz. A música faz lembrar um vinil arranhado dos anos 60, e a manipulação é tão precisa que o público esquece que há fios. O espetáculo equilibra-se entre a comédia e a saudade: é impossível não rir quando o boneco tenta seduzir, nem deixar de suspirar quando o gesto falha. "Summer of 69" é leve como um fim da tarde - doce, absurda e irresistivelmente humana. Um segundo momento para chorar de tanto rir. No final do espetáculo o público foi convidado a ver esta técnica de perto no palco.
Num salvamento vista-se de preto
Para terminar, o terceiro momento decorreu no Café Teatro, onde o britânico Mark Down que repetia antes de ser marionetista tinha sido médico, explicou com o seu humor, muito britânico, o que fazer no caso de uma emergência com marionetas. O resultado de "What to do in a puppet emergency" resulta num espécie de espetáculo stand up, com apenas um simples boneco onde muitas coisas se aprendem. "Se a marioneta estiver na frente da cena é o herói, se estiver atrás é Deus, se não pára de olhar para a direita pensa no passado e para a esquerda no futuro", ensinou na sua conferência. Além destas referências, há também ensinamentos fulcrais como: em caso de emergência, vista-se sempre de preto para não ser visto. Uma forma de poder salvar a marioneta e de se fazer desaparecer. O espetáculo, altamente interativo, resultou numa hilariante coreografia de salvamento para dar vida a esta marioneta, e também aos espectadores que estivessem menos receptivos.
Estes dois últimos espetáculos ainda podem ser vistos esta quinta-feira, no Teatro Rivoli, a partir das 21.30 horas.