A aposta arriscada deste ano, um rei de reggaeton, compensou e muito: nunca se viu aqui um espectáculo assim. Os Indies terão que habituar-se: é "o novo normal".
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O final foi épico, todo a esfuziar pomposo: jatos de fumo, cores berrantes, beats ácidos a bombar, a batida gorda aos saltos, bonecos gigantes aos saltos, gigantones, o ecrã a rebentar continuamente de cores e aquela sirene viciosa de "Mi gente" a soar muito alto - e o público que enchia e atafulhava o palco maior do 8.º Nos Primavera Sound todo solto em delírio. J Balvin, o joker reggaeton da Colômbia que muitos não acreditavam ter hipótese de vingar no festival melomaníaco dos indies provocou à segunda noite a surpresa deste ano: não se limitou a encher, estralou o recinto que ficou a abarrotar. É definitivamente um novo marco.
Nunca se tinha visto aqui um espectáculo assim - uma exclamação pura e dura de reggaeton e logo atirada para o horário nobre do palco principal - e com adesão imediata de tantas gerações: teenagers na maioria da frente colados às grades, braços esticados armados de telemóvel, flashes histéricos, coro repetido em várias canções, braços ondulados ao comando dele, casais e todas as famílias em aglutinação contínua a cantar as letras de cor, selfies a saltar, toda a gente jovialmente entretida a mexer as ancas durante 1 hora 15, um comboio incessante atirado ao coração da quentura do Caribe.
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É um personagem peculiar, José Balvin, 34 anos, cara de rufia de barba mal semeada, parece saído de um gang latino vestido à guna de branco como um maitre de feira concupiscente cuja função é pôr toda a gente a saltar na sua hiper-ultra-mega-feira. Parece sozinho em palco (não está: tem um teclista de cada lado mais um baterista encostado à parede), mas domina todo o palco, corre-o, é seu, é um furacão, arriba, arriba, tem o público todo na mão.
Nem precisaria de recorrer a Ronaldo, mas sim, evocou o nome do rei Ronaldo depois de ter puxado patrioticamente pelo Porto e por Portugal - Ronaldo é evidentemente fã deste reggaeton, já se sabia - e mostrou uma camisola com o CR7 da Seleção que o hat-tricker português lhe enviou para cá. Ele mostrou-a. Foi naturalmente o delírio.
Os desgostosos indies que se refugiaram e encheram o palco Seat onde à mesma hora trocavam os Fucked Up (que nome tão apropriado para o momento...), houve ali o primeiro mosh de rock duro do festival, foi bonito, plateia e bancadas todas cheias em união, terão que se habituar: J Balvin, um artista que eles resumem na simplicidade do substantivo masculino azeite, ponto, mais nada, azeite, J Balvin, ele é "o novo normal" - e o seu efeito veio para ficar porque definitivamente faz a organização vender muitos mais bilhetes do que as apostas do cardápio habitual consensual das raízes do rock.
Agora, uma noite depois, a relativização é uma coisa muito bonita e cheia de humildade: a partir deste momento, o distante concerto de Solange e o seu inesperado requinte tranquilo parece um luxo que não soubemos apreciar, uma oferenda a que não teríamos direito.
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