Sexagenário soul salva o 3.º dia até aos War on Drugs. Merchandise tinha sido o único concerto decente até à hora do jantar em Coura.
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Não será em vão evocá-lo, primeiro porque se justifica e depois porque ele é quem ele é: graças a Deus que chegou Bradley porque o dia estava tão insípido, insípido como quando há chuva, ao ponto de serem os Merchandise a ganhar facilmente a banda do dia.
Merchandise são uma maravilha retrofuturista de pop-rock que vai buscar muitas coisas a 80 e tem uma nova melancolia porque as letras do álbum "After the end", o novo editado pela 4AD, falam de rupturas e do céu a cair, mas eles são novos e têm energia e um guitarrista que é o seu próprio show, que cavalga o seu próprio som, requintado, um aceitável bigode curto que lha dava um ar astuto. O que não sabíamos é que eles superam o seu disco a tocar ao vivo, o contrário do que aconteceu com os Iceage, que apareceram aqui a fingir-se insolentes e não estiveram à altura do seu belo "Plowing" onde se põem a arar sobre o amor e no concerto pareceu seriamente que eles querem dinamitar o seu próprio sucesso, sabotar-se (sim, a tenda negra Vodafone também apinhou e estiveram ali quatro vezes mais pessoas do que há dois anos, mas conheci muitas que não saíram satisfeitas, assustadas até com o som e o sarro punk sem flores).
Graças a Deus Bradley porque nos trouxe um convénio de soul e nos converteu a todos e aos insuspeitos com um real manto r&b e de como se faz Groove e se dá de comer a 25 mil pessoas. Abençoado ele e nós. É outra memória de postal Coura 2015, as cabeças todas iluminadas e os corpos compactos na onda larga que desce a encosta, outra vez toda preenchida de pontinhos negros e ele, Charles Bradley, 66 anos, a deitar-nos a língua de fora e a dizer o que nos quer: "Eu não quero saber do vosso credo nem da vossa cor, eu só quero saber do vosso coração.")
Graças a ele que salvou um dia inteiro (até aos War on Drugs, depois ainda viriam os War on Drugs), porque ninguém se tinha entregado ainda de coração plenamente à música que já vinha desde as 6 horas da tarde do 3.º dia, com demasiada gente a surfar ao lado do psicadelismo rock e do pop e desapontamentos (não demasiado graves ainda assim) com Allah-las e Waxahatche a frustrarem expectativas. Katie Krutchfield pareceu o tempo todo desconcentrada, mas de um modo desinteressado, ela e a baixista também tatuada na perna como ela, trazendo também insipidez ao disco e às letras das perdas delas, que ali não se sentiram a não ser a vaguear perdidas)