A autora da biografia de Agustina Bessa-Luís sublinha o caráter "atemporal" da sua obra, mas também a forte surpresa que a habita. "Encontramos sempre uma frase que nos interpela, nos perturba ou nos alivia", diz Isabel Rio Novo.
Corpo do artigo
"Agustina não nasceu nem escreveu para estar guardada ou confinada ou servida a conta-gotas", defende a autora da biografia "O poço e a estrada", para quem a obra agustiniana não precisa de pretextos para que possa ser lida e recuperada.
Por que continua a ser fundamental ler Agustina Bessa-Luís?
Primeiro, porque é uma das enormes vozes da nossa literatura. Consideraram-na genial ou ilegível, mas sempre única e inimitável. Depois, porque o seu universo é universal e atemporal: será tão atual no próximo centenário da autora como hoje é. Por último, porque, como uma das suas grandes leitoras e amigas disse, abrimos ao acaso um qualquer livro de Agustina e encontramos sempre uma frase que nos interpela, nos perturba ou nos alivia.
Como grande leitora, que textos de Agustina ainda te continuam a apaixonar de cada vez que os lê?
Não sendo especialista no estudo da obra de Agustina, o certo é que durante a escrita de «O Poço e a Estrada» a reli por inteiro, sabendo o quanto continha de referências autobiográficas e memórias familiares, que a própria escritora assumiu e cuja interpretação autorizou e sublinhou. Nesse sentido, a biógrafa é devedora de quase todos os textos da autora. Enquanto leitora apaixonada de Agustina, que também sou, ou que principalmente sou, continua a ser difícil para mim escolher apenas um ou outro título. Mas há dois romances a que regresso mais do que aos outros, talvez. Um deles é "Fanny Owen". O outro é "A Ronda da Noite".
O que espera que as comemorações tragam e quais deveriam ser os seus eixos principais?
Espero que tragam mais leitores da obra de Agustina. Lermos um escritor é a única forma de o mantermos vivo, e essa será a única vantagem das efemérides: servirem de pretexto para aquilo que, no caso de Agustina, não careceria de pretexto nenhum. E espero que essas leituras sejam múltiplas, livres e desimpedidas. Agustina - acho que todos os que a conheceram concordarão nisto - não nasceu nem escreveu para estar guardada ou confinada ou servida a conta-gotas.