Músico Remna Schwarz critica silêncio de Portugal face à situação da Guiné-Bissau
O músico e compositor Remna Schwarz disse, esta segunda-feira, em Maputo, que Portugal tem "ficado muito silencioso" face à situação política da Guiné-Bissau, referindo que o país deve questionar-se sobre as suas responsabilidades e ter um "posicionamento mais concreto".
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"Se calhar Portugal devia-se questionar também sobre a sua responsabilidade, enquanto os nossos povos estão aqui a se debater e a tentar encontrar soluções. Acho que tem que ter um posicionamento mais concreto, sim, mas nós não podemos esquecer que nós temos que trabalhar mesmo enquanto nação (...), a concretizar a nossa visão também da democracia", disse o músico, em entrevista à Lusa, em Maputo.
O Presidente guineense, Umaro Sissoco Embaló, dissolveu o parlamento do país em dezembro de 2023, antes de passados os 12 meses, fixados pela Constituição, das eleições legislativas ganhas pela Plataforma Aliança Inclusiva (PAI-Terra Ranka), liderada pelo Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC).
As delegações da Lusa, da RTP e da RDP foram expulsas da Guiné-Bissau em 15 de agosto, tendo as emissões sido suspensas, por decisão do Governo guineense, que tem agendadas para novembro as eleições legislativas e presidenciais, às quais o atual Presidente já adiantou que vai concorrer.
Face a estes acontecimentos, Remna defendeu que os guineenses devem buscar soluções para estes problemas, mas criticou o silêncio de Lisboa.
"É verdade que Portugal tem ficado muito silencioso à volta de certos assuntos. Dá ao povo e à população um questionamento, não é, em relação àquilo que está realmente a acontecer atrás, por que é que está a se deixar as coisas a acontecer assim", criticou o músico.
Remna nasceu no Senegal, filho de mãe cabo-verdiana e do falecido músico e cantor guineense José Carlos Schwarz, tendo uma careira musical com três trabalhos discográficos e com experiências no cinema, produzindo trilhas sonoras.
Esteve na capital moçambicana para participar num espetáculo musical que marca o fim de uma residência artística e que juntou artistas de Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste, numa iniciativa financiada em um milhão de euros pela União Europeia, o instituto Camões e a Fundação Calouste Gulbenkian, através do Programa PROCULTURA.
Numa avaliação à Lusa sobre a democracia na Guiné-Bissau, o artista criticou os processos eleitorais naquele país africano, pedindo que as próximas eleições sejam "justas e monitorrizadas", considerando que o processo não corre como expetável e que não está a ser respeitada a democracia.
Remna apelou também a soluções a partir dos próprios guineenses para a situação política do país, lembrando a visão de nomes como o seu pai João Carlos ou Amílcar Cabral.
"Acho que a Guiné-Bissau está a cair muito em termos da liberdade de expressão e acho que as coisas politicamente têm que ter muito mais equilíbrio para ter uma consistência em termos económicos e em termos culturais também, porque a cultura tem sofrido muito por causa dos desequilíbrios governativos", acrescentou.
Avaliando o estado da democracia de todo o continente africano, Remna considerou que está a crescer, com os povos a questionar as lideranças e, aos poucos, a concretizar a visão dos "antepassados" que lideraram movimentos de luta contra os regimes coloniais, para libertação dos países africanos.
"Sei que aqui em Moçambique teve aquelas perturbações políticas, mas não só. Fez-se sentir também na Guiné-Bissau, faz-se sentir em muitos países e acho que aos poucos nós temos uma consciência que [África] está a ser libertada e acho que aos poucos vamos conseguir ter e concretizar uma visão que os nossos antepassados como Amílcar Cabral, Nkrumah tinham para nós", acrescentou o músico.
Para Remna Schwarz, uma das soluções para a democracia em África é que se quebre o "silêncio" sobre os problemas concretos dos povos africanos, pedindo a todos para "continuar a dar testemunhos" sobre o que "está a acontecer à volta".
"[É preciso] nunca tentar fechar os olhos sobre os acontecimentos. Então, acho que aquilo que nós temos feito [...] são importantes manifestações culturais, manifestações de rua são importantes, também. Isso é realmente a consciência do povo que está aqui e que está alerta", concluiu.