Alfândega do Porto recebe até 4 de setembro a ambiciosa exposição "Banksy: Genius or vandal?"
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(Per)seguimos Banksy pelos apertados corredores e labirintos da Alfândega do Porto como um detetive em pleno encalço de um qualquer assaltante: com a ilusão de que estamos perto de alcançá-lo. A suspeita demora apenas até ao instante em que, na obra seguinte, o controverso artista inglês aponta numa direção oposta, baralhando o visitante que acreditava ter deslindado o mistério em torno da sua identidade ou, pelo menos, da verdadeira essência do seu trabalho.
Mestre do disfarce, Banksy vai-se metamorfoseando por sucessivas vezes ao longo de "Genius or vandal?", exposição patente até 4 de setembro que reúne 70 obras, entre peças originais, esculturas, instalações, vídeos e fotografias.
Nessas reinvenções e desdobramentos permanentes, encontramos, claro, o artista de rua que começou por fazer-se notar no início da década de 1990 através de inventivos grafitis que começaram a espalhar-se pelas ruas da Bristol natal.
Arremessador de flores
Mas Banksy assume muitos outros papéis na exposição. Como o de candidato a líder de massas que assegura "não haver ninguém mais perigoso do que aquele que quer mudar o Mundo", o hábil marketeer capaz de criticar o capitalismo mas beneficiar do seu alcance em proveito próprio ou ainda o antimilitarista convicto, que retrata soldados de metralhadoras em punho com perturbadores smileys no lugar do rosto e investido de asas de anjo.
Quem visitar "Banksy: genius or vandal?" apenas com o objetivo de confrontar-se com as suas obras mais conhecidas, não se sentirá defraudado.
Da já icónica "Menina com balão" - leiloada por mais de 1 milhão de euros em 2018 e parcialmente destruída logo após a licitação - ao igualmente marcante desenho em que um manifestante atira um ramo de flores como se de um cocktail molotov se tratasse, a mostra cumpre na perfeição esses propósitos mais imediatos.
Por muito que a faceta de provocador à escala global se cole ao percurso do artista, há uma dimensão mais reflexiva que não deve ser esquecida. "As suas mensagens são intemporais. Ele aborda os temas essenciais, como a pobreza, os refugiados ou o consumismo. E leva-nos a pensar, o que ultimamente não fazemos muito", aponta Alexander Nachkebiya, curador da exposição, para quem a sua obra instiga ao debate.
Numa das derradeiras alas da mostra encontramos os trabalhos que nasceram da contaminação artística. A partir da conhecida frase de Picasso segundo a qual "um bom artista copia, um grande artista rouba", Banksy recria à sua maneira grandes obras mundiais, substituindo, por exemplo, a Marilyn Monroe original da serigrafia de Andy Warhol pelos traços contemporâneos de Kate Moss.
Leilão
Dinheiro da venda de obras reverte para a Ucrânia
Os 120 mil euros pelos quais foi vendida recentemente uma cópia de uma obra de Banksy intitulada "CND soldiers" - quatro vezes mais do que a base de licitação - foram doados pelo artista inglês. A verba vai ser utilizada para financiar o Hospital Infantil Ohmatdyt em Kiev, na Ucrânia, anunciou o MyArtBroker, a leiloeira que transacionou uma das 700 cópias existentes desta obra.
Entrevista
"Daqui a 50 anos, será um clássico" - Alexander Nachkebiya, curador da exposição
Por que motivo devemos visitar esta exposição?
Banksy não é apenas um artista. É também um líder de opinião, um especialista em marketing e até, de certa forma, um político. As suas opiniões são válidas para muita gente. Quando começámos esta exposição, em 2017, ele tinha 40 mil seguidores na sua conta no Instagram. Hoje já são mais de 10 milhões. Isso mostra bem que muitas pessoas se interessam por ele.
O interesse pela obra de Banksy manter-se-á mesmo se a sua identidade for revelada?
Tenho muitas dúvidas de que ele algum dia o faça. Ser incógnito dá-lhe muito poder. Já me ofereceram muito dinheiro para que revelasse a sua identidade ou que o apresentasse a alguém. Nunca concordei. Quero manter este sentimento que tenho. Não quero ser o tipo que diz às pessoas que a fada dos dentes afinal não existe.
Em que fase é que ele se encontra de momento?
Está numa fase decisiva. Começou nas ruas e depois passou para as galerias. Agora é visto por milhões em exposições e é importante que faça a transição para os museus, mais concretamente as suas coleções. Se ele conseguir fazer isso, daqui a 50 anos iremos vê-lo como um clássico, pela sua ligação estreita entre a arte, o marketing e a política. É muito importante que ele consiga dar esse salto.