A corda é dos objetos mais presentes nos recreios. É um legado da cultura popular cuja génese já é difícil de situar cronologicamente. Há quantas gerações saltámos à corda? "Playground", de Catarina Campos e Melissa Sousa, quer responder a estas e outras perguntas e reclamar o direito ao jogo também na vida adulta.
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"O recreio como legado humano, intelectual, emocional e físico." Assim descreveram ao JN as coreógrafas da obra que criaram e que agora se apresenta no DDD.
"À uma eu nasci, às duas me batizei/ Às três pedi namoro e às quatro me casei/ Às cinco uma dor, às seis uma aflição/Às sete senhor doutor, às oito no caixão/ Às nove a caminho, às dez no cemitério/ Às 11 no buraco, e às 12 no céu, béu béu!!". A lengalenga, um guião de vida entoado transgeracionalmente nos recreios, quando entoado por adultos ganha um sentido distinto. Este e outros questionamentos foram fonte de pesquisa da obra das coreógrafas que, vindas de uma formação de danças de rua, trazem este espaço para o centro do palco.
Ao escutar com atenção, o espaço de jogo tem toda uma dimensão percussiva - palmas, saltos, a cadência das cordas que lhes serviu para criar toda uma galáxia coreográfica guiada pelo som.
As tradições de "Playground" foram retiradas das culturas populares portuguesa, espanhola e americana e, como explicam as coreógrafas, ainda que haja variantes "às vezes apenas dez quilómetros ao lado", muito fruto da transmissão oral que perpetua as tradições, encontraram muitas similitudes nas melodias ou nas letras.
O material que nasce da experiência de brincar ao ar livre não empurra este espetáculo exclusivamente para um público infantil. Esta é outra das ideias que Catarina Campos e Melissa Sousa tentam desatar. Porque não podem os adultos ter um recreio formal como as crianças?
"Ser o que é, ser descoberta, ser desafio" é uma premissa que deveríamos ter toda a vida, numa constante aventura de revelação. "Em constante dinâmica, procura-se um estado onde os conceitos de criança e de adulto deixam de ter qualquer relevância", explicam.
Na edição passada do DDD, a inauguração foi feita com "Bate fado", da dupla Jonas & Lander, espetáculo estrutural de uma certa cultura portuguesa. Nele se viam Catarina Campos e Melissa Sousa como intérpretes. Este ano, regressam como criadoras, uma evolução natural para que o público possa desfrutar do trabalho da dupla.
"Playground" , de Catarina Campos e Melissa Sousa, sábado 30 e domingo 1 no Auditório Municipal de Gaia, às 15 horas..