Pela 11ª vez, o cinema africano reúne-se em Luxor, a mítica cidade do sul do Egito, banhada pelo Nilo, em cujas duas margens se encontra o maior museu ao ar livre do mundo, incluindo os templos de Luxor e Carnaque e o Vale dos Reis. Desde há uma década, Luxor é também local de reunião de cineastas de todos os cantos de África. A diretora do festival de cinema, Azza Ellhosseiny, contou ao JN os objetivos do evento.
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Quais são os principais objetivos do festival?
Desde a sua fundação que o objetivo do festival é ligar-nos com África, com a nossa terra, o nosso continente, e ter uma plataforma que pudesse reunir todos os africanos num único lugar, criando uma rede de contactos e apoiando os jovens talentos dos países africanos.
Porquê em Luxor?
Para nos descentralizarmos do Cairo. Somos um país muito centralizado, tudo se passa no Cairo e em Alexandria. Luxor pareceu-nos o local ideal para organizarmos este evento cultural. Também por ser uma cidade lindíssima, tem aeroporto e hotéis, há muita gente a trabalhar na área do turismo, as pessoas estão habituadas a acolher gente de todo o mundo. É uma das cidades mais importantes do Egito, do sul do país, onde nos ligamos tão bem com a África, com a sua terra, com o resto do nosso continente.
Como é que as pessoas têm reagido à presença na cidade do festival de cinema?
Para além de queremos ligar os realizadores de todo o continente estamos também a trabalhar na construção de um público para os seus filmes. Não havia nenhum cinema na cidade, nem cineclubes.
Que atividades estão a organizar nesse sentido?
Este ano temos dez workshops, por exemplo em representação, em realização, em animação stop motion, mais virado para crianças, desenho, grafismo, para os estudantes de Belas Artes, como contar uma história. E como este ano o Dia Internacional da Mulher é no meio do nosso festival, vamos celebrar o trabalho das mulheres no cinema.
Também há um programa especial para documentários...
É dedicado a jovens realizadoras africanas que se queiram aventurar pelo documentarismo. Primeiras e segundas obras. Há dez projetos que estamos a desenvolver. Queremos também ter um papel na indústria.
Em várias das projeções a que assistimos vimos turmas inteiras de rapazes e raparigas a verem os filmes...
Faz parte do nosso programa de desenvolvimento de novos públicos. Temos um protocolo com o Ministério da Educação e com o Ministério da Juventude e dos Desportos. Com esses protocolos pudemos trazer uma centena de jovens de todo o Egito. Incentivamos os jovens não só a assistirem aos filmes como a participarem nos vários debates e simpósios que organizamos.
Quantos filmes receberam e quais foram os critérios da seleção?
Nós só aceitamos filmes do ano passado e deste e por causa da pandemia a produção em África decresceu muito. Mas recebemos bons filmes. Foram inscritos mais de 200 filmes e selecionámos cerca de 70, entre todas as secções. O nosso critério é muito simples: na competição oficial, ficção, documentário e curtas-metragens, temos de ter filmes feitos por realizadores africanos, com temas africanos. Na Diáspora temos o outro lado, filmes feitos por pessoas de origem africana que emigraram para outras sociedades, na Europa ou na América. Essas produções não podem competir com as que são feitas no interior de África. Mas assim podemos juntar todos os cineastas africanos numa única plataforma.
Como diretora e programadora, como vê a situação atual do cinema africano?
Nos anos 60 houve um grande movimento, liderado por Ousmane Sembene e tantos outros que se lhe seguiram, como Souleiman Cissé. Mas nos últimos quinze anos há uma nova geração de cineastas africanos, cujas vozes podem agora ser ouvidas e que representam os seus países em Cannes, Berlim, Karlovy Vary, Veneza, todo o lado. Hoje vejo cinema do Sudão, do Ruanda, do Uganda. Mesmo no Egito há novos talentos a surgir. É algo em que tenho muito orgulho.
Têm recebido filmes dos países de expressão portuguesa? Este ano há uma curta-metragem de Angola.
Já tivemos cá o Pedro Pimenta, de Moçambique, o Flora Gomes, da Guiné-Bissau, com o Danny Glover, protagonista de "A República dos Meninos". Estamos sempre à procura de bons filmes, de todos os territórios. Este ano temos filmes de Madagáscar ou do Togo, já tivemos do Benim. É uma forma também de conhecer os temas que eles abordam. E de ver também que há temas que são comuns a toda a África. Como a guerra, a colonização, a opressão das mulheres.
E há também muitos problemas políticos, censura, guerras civis. Pensa que o cinema pode ajudar a consciencializar as pessoas para essas questões?
Tenho a certeza. Um exemplo é o Ruanda. Temos um bom filme, chamado "Perdão". O cinema une as pessoas, As mensagens dos filmes podem ter um papel muito importante para unir as pessoas. África é um continente muito rico. O cinema pode ajudar a resolver os problemas de África.