A colina foi engolida pela multidão e foi perante esse cenário, o de maior enchente numa primeira noite de Nos Primavera Sound, que os Run the Jewels entraram no palco principal ao som de "We are the Champions", dos Queen, esta quinta-feira à noite.
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Não haja dúvidas, eles são mesmo campeões. Explosivos, convertem facilmente os mais descrentes ao seu hip hop insurgente, de batidas e rimas aceleradas e potentes linhas de baixo - é impossível não vibrar com a música e a boa disposição da dupla norte-americana e a plateia acabou a gritar o seu nome.
Já em 2015, tinha sido assim, no palco ATP, e o momento no Porto foi recordado por El-P e Killer Mike. "São a melhor multidão, porque nos apoiam", dizia grato o primeiro. E pelo menos por um dia, depois dos últimos passados naquela cidade, demonstraram (e verbalizaram) querer ser cidadãos da Invicta. Contudo, é o jeito gozão dos dois mc's que trocam rimas entre si como quem carrega no gatilho (Killer Mike é uma máquina a disparar palavras) e piadas nos interlúdios que os distingue. El-P anunciou a desistência do banda para se dedicar à poesia, Killer Mike mandou-o f**** por acabar com o grupo.
Eles falam constantemente ao público, numa interação pouco vista noutras bandas. E o público alimenta-os, levanta os punhos, pula e dança. No momento, somos todos felizes e contestatários.
Os Run The Jewels começaram o concerto sem dó nem piedade, com os temas mais potentes do seu último álbum ("Run The Jewels III", lançado no final do ano) - "Talk To Me", "Legend Has It" e "Call Ticketron". Isto, antes de nos darem as explosivas "Blockbuster Night" e "Oh My Darling Don't Cry" do disco anterior. A noite ficava feita já ali, mas continuaram e de uma sacaram a sua versão de "Nobody Speak", do Dj Shadow, na qual participam.
Regressaram uma vez ao palco para oferecer o tema homónimo do primeiro álbum em conjunto (2013), mas antes houve tempo para ativismo contra "a maioria dos políticos", que não valem nada (digamos antes assim). Uma abordagem às mentiras replicadas nos meios de comunicação para introduzir o tema "Lie, Cheat, Steal" (mentir, enganar, roubar).
Flying Lotus testa novos temas no Porto
Coube a Flying Lotus continuar a noite no palco ao lado e fê-lo com um alinhamento imprevisível (o hip hop quase não saiu da gaveta). "Ouvi uma rapariga dizer que queria que eu tocasse todos os beats", disse, e assim foi, correu por onde lhe apeteceu no momento.
Entre uma espécie de delírio visual, o norte-americano ofereceu temas novos desconhecidos, o que nos faz acreditar que o próximo álbum está muito perto de sair, até porque o último "You're Dead" já é de 2014. Desta, FlyLo volta a transformar-se: a eletrónica (a mesma, bass music) parece ganhar mais terreno ao hip hop e ao free jazz. Foi porém, com um crossover destes três géneros que levou por uma vez ao rubro o público, ainda a recuperar o fôlego de Run The Jewels, quando tocou "Never Catch Me", registo com a voz de Kendrik Lamar. Deu-lhe fôlego, em "See Thru To U" com a voz de Erykah Badu ou "Coronus". O resto foi fantasia sonora e visual. Em contraluz, entre duas telas de projeções, o fundador da Brainfeeder era engolido por universos paralelos, efeitos psicadélicos e figuras bizarras, o que resultou numa espécie de hipnose coletiva.