Primeiro álbum dos Soft Cell em 20 anos traz pop sintética para um presente eterno.
Corpo do artigo
Das bandas synthpop britânicas que moldaram a década de 1980 e o futuro, os Soft Cell são dos menos fiáveis na regularidade e dos mais pendulares na qualidade. Nos últimos 37 anos, Marc Almond e Dave Ball lançaram dois álbuns de originais: "Cruelty without beauty" em 2002 e, agora, "Happiness not included". Pela amostra, a dupla não perdeu foco, nem inspiração, nem o dedo no pulso da eletrónica mais ou menos dançável, mais ou menos pop, que fez avançar a música popular nas últimas décadas.
Dito isto, "Happiness..." não é um sortido atarantado de influências. A modernidade foi absorvida pela estrutura celular dos instrumentais montados com mestria por Ball. Diverso mas uno, os temas tanto se fundem num puzzle como têm o potencial para existir como entidades autónomas. Marc Almond permanece um cantor feito estrela num cabaré existencial em que não será boa ideia entrar. Um filósofo a oscilar entre observações lúcidas do presente, geralmente pouco otimistas, e mergulhos biográficos crus.
O álbum é particularmente glorioso quando carrega no drama. "Bruises on my illusions" é perigoso para si próprio. "Light sleepers" avança lentamente por um nevoeiro pontuado por saxofone. O tema-título é um banho de pragmatismo e talvez o mais próximo do repertório de néon e cabedal dos Soft Cell clássicos. "Nostalgia machine" puxa pelos galões do disco e faz uma (espécie de) festa. A fuga final, em "New Eden", faz-se devagar, com piano e orquestração num crescendo cinematográfico.
O apogeu, é bom de ver, está na colaboração com os Pet Shop Boys em "Purple zone". Um hit em qualquer planeta, soma das virtudes das duas duplas, Hi-NRG à maneira dos 80 com ecos do som triunfal de Neil Tennant e Chris Lowe da era "Very" (1993), um foguetão que dispara para o infinito enquanto dois homens de meia idade entoam "Let"s get out of this life/ I"m afraid and alone/ Paralysed in the purple zone". Dura três minutos, devia durar pelo menos 13. Se for este o som da despedida dos Soft Cell, é uma saída em aclamação.
Happiness not included
Soft Cell
BMG/Warner