
Chrissie Hynde, a vocalista dos "The Pretenders", foi um vulcão em palco (Rui Manuel Fonseca / Global Imagens)
Rui Manuel Fonseca / Global Imagens
Sem surpresas, Peter Murphy deu o concerto da noite no primeiro dia da edição de 2018 do festival EDP Vilar de Mouros. O vocalista de Bauhaus tinha, à partida, tudo para protagonizar o melhor espetáculo do primeiro dia e não foi por falta de competência do britânico que as coisas não correram melhor.
Apesar de pontual, Peter Murphy só subiu ao palco quando faltavam dez minutos para as duas da madrugada. Nessa altura, já Vilar de Mouros estava com cinco concertos em cima, mas reviveu "Bauhaus" até perto das três da manhã. Estava menos público que para os "The Pretenders", por exemplo. Quem ficou já usava as reservas de energia possíveis, e só Peter Murphy conseguia dar um concerto tão emblemático àquela hora.
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Sinistro, com laivos de ameaça, entrou em palco de preto e branco com um cachecol e casaco que rapidamente tirou. Do início ao fim foi só "Bauhaus", a tal banda criada há 40 anos e que deu o mote para Peter Murphy convidar David J fazer uma digressão pela Europa.
A toada sombria que os "Bauhaus" (e Peter Murphy) imprimem em quase todos os temas não pareceu fácil de assimilar por parte de um público cansado, à exceção de algumas centenas que saltaram nas filas da frente durante o concerto todo. De resto, concerto exemplar.
A primeira homenagem deve ser para o convidado David J. A imponência do baixo em temas como "She"s in Parties" ou "Bela Lugosi"s Dead" é a diferença entre uma banda tocar com ele ou com outro baixista qualquer. A segunda homenagem é para Peter Murphy, e Bela Lugosi"s Dead" é o perfeito exemplo do que aconteceu ali durante uma hora e dez minutos: Peter Murphy a dar tudo, a cantar perto do público, primeiro à esquerda e depois à direita, mas com poucas reações como agradecimento, com a ressalva de um punhado razoável de telemóveis que se erguiam à passagem da estrela do primeiro dia.
Peter Murphy apresentou um alinhamento próximo dos concertos que já deu nesta digressão comemorativa. Começou com "King Volcano" e só ao quarto tema, "In The Flat Field", arrancou os primeiros cantares de cor. Em "Silent Hedges", Peter foi buscar uma coroa de brilhantes e entrou no dilema de a colocar em si próprio como parte do espetáculo. A música acaba com Peter Murphy de coroa, símbolo do que o vocalista de "Bauhaus" foi para esta edição do festival Vilar de Mouros.
"A God in na Alcove" foi o ritmo agressivo que se seguiu e o público correspondeu. Parecia ter acordado, mas a hora era muito tardia. Entretanto, Peter Murphy parecia preocupado, ora em dar indicações à mesa de som, ora em ajeitar o bigode arredondado e o colete que lhe tapava a barriga de 61 anos. Ainda assim, irrepreensível.
"She"s in parties" e Bela "Lugosi"s Dead" pareciam temas desconhecidos da maioria mas a "ressurreição" do público deu-se novamente. Foi no décimo tema, "The Passion of Lovers", que debita distorção bruta em formato punk que acorda qualquer alma desgastada devido à hora tardia. "Stygmata Martyr" e "Dark Entries" foram as últimas antes do encore que só trouxe mais um tema antes do abandono de palco.
Grande parte da culpa do cansaço do público deveu-se a uma roqueira experiente chamada Chrissie Hynde. A vocalista dos "The Pretenders" foi um vulcão em palco mas antes teve de cativar a atenção dos festivaleiros. Baladas como "Hymn to Her" ou I"ll Stand By You" deixaram famílias inteiras sideradas na imensa voz de Chrissie: "Peço desculpa por tocar músicas antigas, mas temos de as tocar não é", justificou.
Depois, o momento de dança. Chrissie perguntou "quem quer dançar" antes de "Don"t Get me Wrong" e pôs o recinto todo a fazê-lo. Dali ao fim houve muito rock and rol, laivos de folk e muita energia dos dois lados. No fim houve elogios a Vilar de Mouros: "Público fantástico e ótima noite", resumiu Chrissie.
Johnny Rotten foi a primeira lenda antes da dança elétrica de The Human League
Era o primeiro grande nome do cartaz deste ano de Vilar de Mouros e o público não saiu com as expectativas goradas. Ao longo de cerca de uma hora, o ex-Sex Pistols Johnny Rotten fez jus ao epíteto de lenda deste cartaz e agarrou o público. PiL demorou a conquistar, mas deixou o palco do Alto Minho com uma chuva de aplausos de rendidos.
A coisa também não era para menos. O fim do concerto com a controversa "Shoom", onde manda meio Mundo para locais menos próprios enquanto um baixo aguerrido destoa de um ritmo típico do experimentalismo dos anos 80, foi o encerramento perfeito para um concerto onde o público maduro estava em maioria.
Antes houve "Public Image", música como nome do quarteto, a primeira depois de um encore precedido de "Rise" onde mostraram que quem sabe nunca esquece, apesar de alguns desacertos notórios, aqui e ali, quase sempre na bateria. Quem se importa? Todos estavam ali para ver o "frontman" de PiL, Public Image Ltd, criada em 1978 após Johhnny Rotten deixar os Sex Pistols. Ele contorce-se, sua, despenteia-se, canta, desafina, berra e fala pouco. À antiga, como se quer.
"The Human League" foram os senhores que se seguiram. Também aqui o melhor ficou para o fim. O tema mais conhecido, "Don"t You Want", cativou quem ainda não estava a dançar, antes do "encore". Foi o primeiro grande momento de festival propriamente dito, onde filhas, na fila da frente, sobem para as cavalitas dos pais, vibram, abrem os braços e sorriem.
Há mais gente feliz em "Human League", conjunto onde se destaca Philip Oakey que trocou de roupa quatro vezes. O fim é deixado a "Together in Electric Dreams" que pôs pelo menos meio recinto a dançar e a cantar de cor o tema feito em 1984 para o filme homónimo de Steve Barron.
O primeiro concerto coube a Cavaliers of Fun, conjunto que une membros de Londres e Lisboa, e que durante pouco mais de meia hora levaram um pop-rock tropical pincelado a eletrónica à aldeia minhota. O grupo, que venceu o EDP Live Bands em 2015, teve direito a gravar "Astral Division", álbum que marcou a atuação deste energético trio em Vilar de Mouros.
As portas do festival abriram pelas 17.30 horas e, curiosamente, os primeiros festivaleiros a entrar foram oito reformadas naturais de Vilar de Mouros.
A organização, a cargo da Câmara de Caminha, Junta de Freguesia de Vilar de Mouros e produtora Surprises and Expectations, espera cerca de 30 mil pessoas até sábado à noite. Diogo Marques, da produtora, revela que foi propositada a opção de ter um cartaz revivalista "que permite a presença de várias gerações".
Hoje, segundo de três dias do festival, há Scarecrow Paulo (19 horas), GNR (19.55), David Fonseca (21.10), Editors (22.35), Incubus (0.15) e Kitty, Daisy & Lewis (1.50).
