Janaína Leite é uma encenadora, atriz e dramaturga brasileira amplamente reconhecida pelas contribuições para o teatro contemporâneo. A sua carreira destaca-se pela abordagem experimental de temas pessoais e sociais complexos, utilizando uma combinação de linguagem documental, autobiográfica e performativa.
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"Stabat Mater", obra de Janaína Leite integrada no 47.º Festival Internacional de Teatro de Expressão Ibérica - o espetáculo tem a sua segunda e última récita esta sexta-feira no Teatro Rivoli, no Porto, às 21.30 horas -, prometia uma imersão profunda nas complexidades da maternidade e da identidade feminina. Mas, embora seja evidente a intenção de criar um teatro autobiográfico e documental que provoca e questiona, a produção perde-se na sua própria pretensão e excesso de simbolismo, escudada em referências bíblicas, estudos, teses, filmes de terror, cenas gore e pura pornografia hardcore.
Desde o início, o espetáculo apresenta uma série de cenas desconexas que parecem mais um patchwork do que uma narrativa coesa. A tentativa de Leite de misturar elementos pessoais com questões universais resulta numa colagem confusa e não raras vezes autoindulgente. Os diálogos soam artificiais e forçados, apesar de existir uma pretensa naturalidade - sobretudo quando a atriz dialoga diretamente com o público.
A performance de Janaína Leite, apesar de intensa, carece de nuances e variações emocionais. A escolha de adotar um tom monocórdico durante quase toda a peça acaba por ser cansativa. Momentos que deveriam ser de grande impacto emocional são diluídos pela falta de contraste e pela repetição de recursos dramáticos.
A constante exposição de temas íntimos e traumáticos, como o relato detalhado de um abuso sexual, a história do pai que tem encontros com prostitutas para afastar a solidão, o ex-marido e as suas agressões, sem um desenvolvimento mais aprofundado gera um efeito contrário ao desejado: ao invés de empatia, surge o desconforto e a sensação de voyeurismo.
Qual é a pertinência de ver o parto do filho, em que insiste em fazer um loop visual com a criança a entrar e a sair da vagina? Ou, já noutro quadro, por que somos obrigados a vê-la fazer um filme pornográfico, com cenas explícitas e em grandes planos, dirigido pela sua mãe? E que ritual sádico é esse em que a mãe está sempre presente apesar de tudo?
Visualmente, "Stabat Mater" tenta impressionar com uma cenografia carregada de simbolismos religiosos e referências estéticas, mas que acabam por ser superficiais e excessivamente óbvias. A repetição de ícones católicos e a insistência em rituais performativos tornam-se previsíveis. A luz, embora bem executada, não consegue salvar a monotonia visual que predomina ao longo dos (excessivos) 110 minutos do espetáculo.
A música consegue criar uma atmosfera que, em momentos isolados, sustenta a tensão e a carga emocional pretendida. No entanto, mesmo essa qualidade não é suficiente para resgatar a produção da sua abordagem unilateral e hermética.
Ato falhado: "Stabat Mater" acaba por ser um exemplo de como a busca pelo experimentalismo pode resultar numa obra desconectada do seu público.