"Despe-te Isabel", da Ensemble, foca-se na rainha inglesa que se recusou a casar e ter filhos
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O longo reinado de Isabel I de Inglaterra, entre 1558 e 1603, estabilizou o país após uma conturbada crise de sucessão e foi contemporâneo do florescimento do drama inglês, encabeçado por Shakespeare e Marlowe. Mas o traço da rainha destacado pela peça de Ella Hickson (n. 1985) "Despe-te Isabel", que estreou em Londres em 2019, foi a sua recusa em casar-se e ter filhos, a sua resistência a uma "visão masculina dos assuntos de Estado." E o objetivo declarado do texto é "trazer luz a problemas atuais através de um prisma histórico".
"Com a guerra na Ucrânia é altura de perguntar se queremos continuar a ter homens no poder, ou pelo menos uma certa forma de pensar que se afirma pelo poder das armas", diz Emília Silvestre, uma das quatro atrizes, com Ana Pinheiro, Filomena Gigante e Margarida Carvalho, que interpretam as personagens, masculinas e femininas, na produção do Ensemble - Sociedade de Atores de "Despe-te Isabel", que tem encenação de Pedro Galiza.
Resumida a cinco bancos, um espelho-camarim e quatro atrizes, a montagem dá conta da dimensão "auto-paródica e metateatral sobre o que é hoje fazer um drama histórico", diz o encenador, e pode ser vista como "peça litúrgica e dionísiaca, ou como teatro pagão e cristão". Concentrando-se na história de Isabel, desde o período em que foi encarcerada por ordem da irmã, Maria I, à sua condução do reino inglês, evitando pretendentes e esquivando-se às "manobras do patriarcado", a peça de Hickson, que utiliza linguagem e referências atuais, baralhando propositadamente as épocas, encerra também o pano de fundo histórico, referindo-se a algumas das crises enfrentadas pela rainha, como a ameaça da "armada invencível".
O crítico de teatro do "The Guardian", Michael Billington, elogiou a produção inglesa, mas considerou forçada a projeção de Isabel I no presente. "É difícil imaginá-la como paradigma da modernidade. E convém lembrar que numa monarquia a procriação é acima de tudo uma necessidade política." No Teatro Helena Sá e Costa será possível avaliar o êxito dessa transposição do século XVI para os atuais debates sobre igualdade de género.
"Despe-te Isabel"
Teatro Helena Sá e Costa, Porto
Até sábado, 12 de março