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Quando o chefe do Governo da República reconhece que há "politiquice a mais" em Portugal, quem somos nós para duvidar? Quando o primeiro-ministro, que falava no Japão, noutro fuso horário, com outras prioridades em mente, pede aos agentes mediáticos que se concentrem "na maré positiva do país", quem somos nós para discordar? Mesmo que Luís Montenegro seja, há anos, um político profissional que se move com destreza na bolha mediática, mesmo que, noutra condição, tenha, ele próprio, sido um dínamo partidário dessa tal politiquice que agora lhe causa urticária. Ainda assim, Montenegro tem razão: o Portugal político dedica demasiado tempo a questões laterais, embrenha-se de forma fatídica em temas que não fazem espelho com a vida dos cidadãos. Esta é, também, uma das razões para a explosão do Chega, partido que diz o que as pessoas querem ouvir, mesmo que para isso tenha de mentir descaradamente.
Porém, não basta que um primeiro-ministro, provavelmente enfadado com notícias chatas para a maioria que lidera, lance murmúrios do outro lado do Mundo. A tal agenda positiva é, em primeiro lugar, responsabilidade de quem decide, de quem governa. É dele. Um estudo recente do Instituto Reuters concluiu que o número de pessoas que evita notícias - sobretudo as mais difíceis de ouvir - atingiu o valor mais elevado de sempre. Os spin-doctors sabem-no. E por isso preferem aprofundar os mecanismos de comunicação e propaganda sem filtros, entregando aos consumidores de informação (e eleitores) aquilo que lhes interessa. Portugal tem imensas valias, mas não é um altar acrítico de notícias positivas. E o "otimista irritante" já não está entre nós.