Fraca capacidade de investimento das editoras e menor apetência dos leitores para novas obras justificam tendência.
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São um dos poucos segmentos em alta num mercado a braços com uma crise profunda. Desde a eclosão da pandemia, as reedições ganharam um peso significativo na oferta editorial, chegando a representar 25% das vendas.
Editor da Quetzal, Francisco José Viegas reconhece que esse interesse não é alheio ao "menor investimento" disponível. Por isso, a publicação de obras de autores célebres - muitas das quais já libertas dos respetivos direitos autorais - contrasta com a incerteza associada ao lançamento de novos autores. Foi o que aconteceu no início do ano, com o surto de edições do britânico George Orwell, autor cujos livros entraram no domínio público.
Mas não é apenas o menor dinheiro em caixa por parte das editoras que está na origem desse ressurgimento das reedições. "Em momentos de crise, os leitores arriscam menos. A vontade de ler obras mais experimentais cai. Como os tempos são de incerteza, procuram zonas de conforto e livros de autores já conhecidos", explica Cecília Andrade, editora da Leya.
A ideia de que os leitores tendem a "jogar pelo seguro" nestas alturas também é perfilhada por Viegas. Todavia, o editor e escritor relaciona essa tendência com o "reforço de uma espécie de memória da literatura" numa época de sobrevalorização do entretenimento. "Não é por acaso que se regista um incremento da procura do livro usado. É a procura de uma certa autenticidade que não é totalmente assegurada na edição comercial", aponta.
Edições "sem critério"
Atento às flutuações e tendências do mercado, Manuel S. Fonseca, editor da Guerra & Paz, admite ter reforçado nos últimos anos a aposta neste segmento, optando por combinar as novidades com as reedições e reimpressões. Inscreverem-se neste último caso obras de autores como Machado de Assis, Eça de Queirós ou Mark Twain. "A nossa política tem dado resultados e resolvemos mantê-la para este ano", adianta.
Também na Editorial Presença o número de reedições tem vindo a aumentar "ligeiramente", graças à edição de clássicos e à procura elevada de livros de Ken Follett, J. K. Rowling ou Heather Morris, o que tem originado reimpressões. Para Tânia Raposo, as "reedições não só são procuradas pelos leitores como são reclamadas por eles".
Se o regresso dos clássicos às apostas editoriais parece constituir uma boa notícia, há, contudo, danos colaterais a registar. Na conjuntura atual, com a redução acentuada dos planos editoriais, Cecília Andrade afirma que "os novos autores são os mais penalizados", já que "as apostas das editoras diminuem".
A propagação de clássicos esconde ainda outro risco, quando as respetivas edições são feitas "sem critério", com um aproveitamento total das edições que circulam na Internet em versões PDF. "Esse erro vai pagar-se caro a médio prazo", adverte Francisco José Viegas.