Coreógrafa é Cavaleira das Artes e das Letras do Governo francês e vem em dose dupla ao Festival DDD com "Versa-vice" e "Madmud". A artista confessa-se ao JN.
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Tânia Carvalho, coreógrafa e uma das mais polifacetadas artistas portuguesas estreia a nova obra "Versa-cice" no Teatro Rivoli, no Porto, no âmbito do Festival DDD - Dias da Dança, esta sexta-feira, com nova récita no sábado. Na segunda-feira protagoniza um concerto a solo no mesmo palco. Recentemente foi distinguida pelo Governo francês pelo seu labor nas artes.
Este ano tem sido programada nos festivais com mais de um espetáculo, é uma sobrecarga?
É muito bom apresentar mais do que uma coisa num festival, quanto mais coisas se vê de um autor mais se começa a perceber. Quando vejo várias coisas de um criador tenha a sensação de que as peças começam a falar mais comigo. No meu caso, também é bom porque posso apresentar uma coreografia, uma exposição de desenho e o filme. No DDD vai ser a peça nova e também um concerto.
Como foi o processo criativo de "Versa-vice"?
Esta peça é um pouco baseada na "Fenícias", passei muito tempo a analisar a estrutura e fiz a música, mas, ao contrário de "Onironauta", nesta tive de gravar a música. E ao fazer a parte musical tive de imaginar o que ia acontecer. Apesar dessa preocupação de ter tudo muito estruturado, é uma peça que alimenta muito o lado criativo dos intérpretes. Quis que esta peça tivesse um lado mais caótico, um aspeto mais desorganizado.
Mas como é na prática? Diz aos intérpretes que têm x compassos para fazer o que quiserem?
Não, continua a ser orientado, mas é uma proposta do tipo: nesta parte queria que o gesto fosse feito de andares estranhos, ou seja, é livre, mas no final tem tudo livre é um trabalho direcionado.
Quanto ao concerto "Madmud" também tem essa liberdade?
O "Madmud" é um concerto que já faço há muito tempo. Vou fazendo músicas, decido pô-las no concerto. É um concerto de histórias, de músicas que fiz, de coisas em contínuo. Decidido o repertório, é só ensaiar.
Sofre do síndrome do músico sempre em busca da perfeição?
Sim, estou sempre a trabalhar e o trabalho evoluindo. Neste espetáculo sou só eu, e há um tempo de metamorfose que posso respeitar. Consigo fazer as coisas sozinha, apesar de fazer muitas peças de grupo [risos]. É uma ambiência mais introspetiva, uma escuta do que estou a dizer agora.
Com tantas criações em simultâneo há contaminação?
Há contaminação, algumas coisas vou buscar de propósito porque gosto de revê-las. Nesta peça trago algo de "Olhos caídos" - quem conhece perceberá. Outras repetições aparecem sem querer, como a parte da "Tecedura do caos".
Como encarou a distinção de Cavaleira das Artes e das Letras do Governo francês?
A nomeação foi uma surpresa muito grande, não estava nada à espera. Ligaram-me a perguntar se eu aceitava, eu nem estava a perceber se estava a ouvir direito [riso]. Foi uma sensação muito boa, de um país que sempre apoiou muito o meu trabalho.
Tem distinções em Portugal?
Nunca tinha recebido nada assim. Só recebi a medalha de mérito da minha cidade, Viana do Castelo.
Tem várias peças a estrear em simultâneo em vários países?
Sim, trabalho muito com outras companhias. Por exemplo o Ballet de Marseille está agora a rodar com uma coreografia minha. Com o Ballet de Malta também estou a ensinar uma peça para eles aprenderem. A mesma coisa aconteceu com a companhia Dançando com a Diferença, em que o trabalho se faz com os ensaiadores. Tem havido este ano concentração em diferentes países. As pessoas dizem: "Mas tu sonhaste com isto..."
E sonhou?
Nunca sonhei com isto, é muito além do que poderia ter imaginado. Não podia sonhar estrear em dois países no mesmo dia.
E vai continuar neste ritmo?
Além das peças que estão a circular, também ensaio com a companhia francesa de teatro HKC para estrear em novembro. Eles trabalham muito bem, têm muito tempo.