Tiago Guedes: "Sair em alta é fantástico, o Teatro Municipal do Porto está num momento vivo e vital"
Tiago Guedes deixa o Teatro Municipal do Porto (TMP), instituição que dirige desde 2014, ano em que ganhou o concurso internacional lançado pelo executivo de Rui Moreira, e depois de um longo hiato em que o Teatro Rivoli esteve concessionado. Além do TMP, é também diretor do Festival Dias da Dança (DDD) e do CAMPUS Paulo Cunha e Silva, centro de residências artísticas. O JN esteve à conversa com o diretor que a 1 de julho assumirá a direção da Maison e La Biennale de La Danse de Lyon, em França.
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Um festival, um centro de residências e dois teatros: há alguma coisa que tenha deixado por fazer?
Tive muitas possibilidades entre junho de 2014 e junho de 2022. Houve uma consolidação da estratégia traçada para as artes performativas. A primeira foi unir os dois teatros (Rivoli e Campo Alegre) numa só instituição [TMP ]. Depois, a visibilidade na cidade e nas cidades à volta. E para terminar um equipamento para colmatar as necessidades dos artistas da cidade, para desenvolver projetos, ensaiar. Nesse sentido, o CAMPUS fechou a quadratura, cobrindo todas as áreas. Temos espaços de pesquisa, de ensaio, de apresentação de espetáculos e um evento internacional para divulgar o trabalho. Tínhamos uma linha de ação e uma missão política. Tive um grande apoio político e financeiro, foram condições únicas. No final, ganhámos todos, teatro, artistas e público.
A taxa de ocupação quase sempre a rondar os 90% demonstra o acerto da aposta das suas programações?
Na realidade, isso foi logo desde o início, ainda antes da minha chegada. O programa "O Rivoli já dança", que durou quatro meses com o Paulo Cunha e Silva, lançou o mote. Muito centrado na dança, levou a que as pessoas reencontrassem este lugar. Mas também percebemos rapidamente que o público tinha de ser alimentado e desafiado. Tivemos uma programação muito diversa que toca interesses muito diferentes. O público não será um problema no Teatro Municipal do Porto. Temos um público fiel e seguidor e uma equipa extraordinária.
O facto de ser apoiante público do PS trouxe-lhe algum dissabor?
De todo, isso é uma particularidade interessante, nomeadamente com o Rui Moreira. Há uma separação da vida pessoal e da vida profissional. Até porque eu sou deputado municipal do PS, em Alcanena, mas vou pedir agora rescisão. Sempre foi muito importante, esse respeito e essa separação das coisas.
Além do vivido, e da programação propriamente dita, o que fica para o futuro?
Fica a cidade do Porto dotada de vários equipamentos de excelência, grandes artistas do Porto e grandes artistas que vieram viver para o Porto. Perceberam que há condições de acompanhamento e de criação nas artes performativas. O Porto é um sítio inspirador e tem agora uma marca de apoio às artes performativas. Sair em alta é fantástico, o teatro está num momento vivo e vital. Nesta pós-pandemia, as pessoas estão a regressar com muito entusiasmo. Já há alguma nostalgia da minha parte.
A nível artístico, vê uma nova geração marcada por estes oito anos?
Uma das grandes missões do teatro foi a coprodução. Um apoio muito transversal em várias áreas e também na internacionalização. Muitos dos artistas estavam a começar e nós fomos o catalisador, mas nada disso teria acontecido se não tivessem talento. Como, por exemplo, o caso do Marco da Silva Ferreira, que tem um talento extraordinário.
O que foi mais doloroso: deixar o Teatro Municipal do Porto ou o Materiais Diversos?
[Risos] São coisas muito diferentes. Com o Materiais Diversos tinha uma relação de paternidade, montei uma estrutura de produção quando era muito novo, na minha terra, era um projeto muito familiar. Tive de fazer um afastamento estratégico forçado e mergulhar no Porto, para deixar a Elisabete Paiva [diretora da Materiais Diversos] trabalhar. Tinha um grande sentido de pertença. No TMP, como nas instituições públicas, há um sentido de missão. Estou muito feliz pelo trabalho que fizemos, há uma certa nostalgia pelas relações humanas e pelo público. Mas não acho que as pessoas se devam eternizar nos cargos. É importante para as instituições que não estejam mais do que oito, dez anos, é um novo fôlego para as equipas.
Qual foi o momento mais complicado durante estes oito anos no Porto?
Foi o encerramento do TMP durante a pandemia. Um momento de grande reflexão e restruturação. Pensar em como inventar maneiras de apoiar os artistas com o teatro fechado, num momento de plena atividade e expansão. Foram inúmeros encontros jurídicos e com outros artistas. E depois pensar em como transformar as peças para deixarem de ser ao vivo e passarem a ser online. Foi a criação de novos modelos de trabalho, pensar no que temos de dar ao público e aos artistas. Os teatros que coproduzem têm um sentimento de responsabilidade para com a comunidade artística. Mas, nos meios digitais, aconteceram coisas profundamente interessantes.
Estes anos também foram bons para a articulação com outras estruturas artísticas da cidade?
Muito bons. A certa altura, uma estrutura como o DDD teria de acontecer em vários teatros, teria de ser um projeto coletivo. Também defendo verdadeiramente as coapresentações. Duas agendas em que se cruzam os públicos e vice-versa. Este é um modelo amplamente difundido na Europa Central. Com este modelo, é possível trazer projetos de grande envergadura financeira - eu sou um militante dessa causa.
O que fica fechado?
Tenho a temporada 2022-23 fechada na totalidade e o DDD a 70%. E algumas pinceladas até ao final de 2023, para quem vier poder encontrar uma base sólida.