Paredes de Coura abraçou Zaho de Sagazan, a menina-prodígio da "chanson française" que, com um concerto eletrizante, colocou a plateia num raro estado de êxtase. Vampire Weekend não entusiasmaram.
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Se a abordagem inovadora que Sagazan faz da "chanson française" é digna de levar nomes como Charles Aznavour, Léo Ferré e Charles Brassens a darem voltas no túmulo, não será por escândalo ou conservadorismo. A música que produz, juntando a batida eletrónica desenfreada à base vocal característica do mais emblemático dos géneros musicais franceses, é de tal forma viciante que não surpreenderia se conseguisse contagiar até os que já não se encontram entre nós.
Imagens de gosto duvidoso à parte, Coura testemunhou na primeira noite o que pode muito bem ter sido o início de uma relação duradoura com o público português, à semelhança de vários países em que tem feito furor (na próxima semana, prepara-se para esgotar o Estádio de Munique). Na sua estreia nos palcos nacionais, a irredutível gaulesa não precisou de muito tempo para demonstrar o acerto da organização ao colocá-la num lugar proeminente no alinhamento, mesmo que o desconhecimento inicial imperasse em boa parte dos presentes.
Com uma entrega total, a autora de "La symphonie des éclairs" fez jus ao título do seu disco inaugural - foi um trovão que iluminou a noite, provando que as aproximações mais radicais a um género tão delicado como a "chanson", autêntico património imaterial dos franceses, podem ser não só enriquecedoras, como geradoras de dinamismo.
Quando, a meio do concerto, Zaho se virou para a plateia e confessou que adorava a canção francesa, "mas também a música eletrónica", ninguém terá ficado espantado. De ambas se mostra credora e, embora a toada matraqueante própria das raves pareça sobressair, a base é a tradição. Até porque, a fazer fé na eficácia das suas músicas, as máquinas também têm sentimento, ou, pelo menos, conseguem provocar em quem as escuta uma plêiade de estados de espírito.
O forte apelo à dança que atravessa estes temas ateou a euforia no anfiteatro courense, deixando a francesa de 26 anos siderada com a reação popular. "Nunca esquecerei este concerto", deixou escapar, emocionada, instantes antes de abandonar o palco após interpretar uma criativa versão de "Modern love", de David Bowie.
Fotos: Leonel de Castro
De Nova Iorque para Coura
A silhueta pode não ser tão adelgaçante como a de outrora, a calvície pode até já insinuar-se em alguns dos seus membros, mas da música dos Vampire Weekend continua a exalar um forte odor juvenil. Para o melhor e para o pior.
No concerto que encerrou o Palco Vodafone no primeiro dia do festival, os nova-iorquinos fizeram uma "tour" pela sua discografia que, sem surpresa, obteve maior eco do público quando a escolha recaiu sobre os primeiros discos, o homónimo de 2008 e "Contra", editado dois anos depois, acolhidos com um misto de entusiasmo e nostalgia.
É pena que assim tenha sido, porque, instrumentalmente, os Vampire Weekend evoluíram imenso desde então, ao alargarem as suas referências sonoras, mesmo que a eterna voz em falsete de Ezra Koenig e as letras pueris traiam os legítimos anseios de maturidade.
Ao interpretarem os temas de "Only God was above us", em 2024, foi visível um maior empenho da banda na sua exploração musical, ao invés dos mais badalados "I stay corrected" ou "A-Punk", tocadas em piloto automático. Nada que perturbasse o acolhimento popular entusiástico.
Foto: Leonel de Castro