Judoca Célio Dias foi o único atleta olímpico a assumir a homossexualidade e sofreu preconceitos. Isabela Sousa, do bodyboard, explica ao JN que o desporto é machista.
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Foi em fevereiro de 2018, durante uma entrevista, que Célio Dias quebrou todas as barreiras e tornou-se no primeiro e único atleta olímpico a assumir ser homossexual. "Foi um processo natural. Depois de contar aos meus, deixou de haver barreiras para mim", começou por recordar, ao JN, o judoca.
Mas, ainda assim, o atleta admitiu que não conseguiu fugir ao preconceito. "Ouvi comentários enquanto competia. Sem querer falar de casos, no seio da seleção houve episódios menos felizes. A verdade é que eu sempre fui bem-sucedido no judo e isso fez com que as pessoas tentassem pegar nessa vulnerabilidade. Mas, para mim, a homossexualidade nunca foi um ponto de fragilidade, pelo contrário. Os episódios não foram tão poucos quanto isso. Mas só me tornaram mais forte. Se a descriminação na seleção foram de responsáveis ou de atletas? Dos dois", acrescentou. O JN confrontou a Federação Portuguesa de Judo sobre o tema, mas não obteve resposta.
Passaram cinco anos e Célio Dias, que representou Portugal nos Jogos Olímpicos de 2016 e hoje tem o projeto "Cellympius", dedicado à saúde mental, continua a ser o único atleta homem que em Portugal falou sobre a homossexualidade e a culpa, no seu entender, é da sociedade.
"Ainda estamos perante uma sociedade em que o patriarcado tem muita força. Pode ser por causa disso que os atletas encontram uma barreira. E depois, as grandes figuras do desporto são heterossexuais, as marcas apostam em figuras heterossexuais, seja no feminino, seja no masculino. Intuitivamente, os atletas assumem que, se falarem, não vão ser tão bem sucedidos".
"O desporto é machista"
Isabela Sousa é atleta de bodyboard brasileira a viver em Portugal há cinco anos. Foi tetracampeã em 2016 e é a atual campeã do circuito Mundial, feito que já conseguiu cinco vezes. Em julho de 2021, decidiu assumir-se como sendo homossexual. "Recebi muitas críticas, quase todas de cunho religioso. Mas, no final, senti muito mais amor vindo das pessoas que me seguiam. Aprendi que sermos nós próprios tem um preço e as agressões magoam. Mas fortalecem a luta pela nossa liberdade", contou, ao JN.
A atleta, de 33 anos, culpa o "machismo" pela maior dificuldade de haver atletas homens a falar sobre o assunto. "O desporto é um ambiente muito machista. E acho que isso é o principal fator pelo qual os homens homossexuais ficam com medo de falar. Ainda estamos longe de ter um ambiente justo. Exemplo disso é a falta de patrocínio com atletas que são declaradamente homossexuais. Muitas empresas, clubes e entidades fazem campanhas publicitárias no mês da diversidade, mas pouco ou nada apoiam esses atletas. A realidade ainda é muito cruel para atletas homossexuais que têm o desporto como profissão".