Uma lua brilhante, embora encoberta pelas nuvens, e uma pequena lanterna frontal foram os guias dos cerca de 450 atletas que, na noite de sábado, participaram no trail e caminhada dos "Caminhos de Mellares", em Melres, organizada no âmbito de Gondomar da Cidade Europeia do Desporto 2017.
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As provas - uma caminhada e um mini-trail de nove quilómetros e um trail de 17 - tiveram o tiro de partida junto ao rio Douro e estenderam-se até alguns dos pontos mais altos da freguesia, com os participantes do trail a calcorrearem os socalcos da serra até aos 600 metros de altitude.
A grande paixão pela corrida é o alimento que lhes dá forças para ultrapassar todos os obstáculos físicos, mentais e naturais. E, apesar de todo o esforço e das dores sentidas ao longo do sinuoso trajeto, desistir é palavra que estes atletas nem ousam pronunciar. Na mente só a vontade de cortar a meta e conquistar uma medalha que comprova mais uma superação.
Campeão entre o pelotão
Entre o quase meio milhar de competidores não faltam exemplos de dedicação a este desporto. António Martins, de 48 anos "grandes" - como prefere dizer quando se lhe questiona a idade -, do Centro de Ciclistas de Gondomar, é um deles. Não consegue precisar há quantos anos começou a correr, salienta apenas que nunca teve treinador e muito menos médico, mas no currículo conta já com um sem-número de vitórias em trails.
"Já fui campeão nacional do circuito de montanhas de veteranos e já ganhei muitas corridas a nível dos trails", diz, com orgulho, este trabalhador da construção civil, que após o árduo trabalho, mal chega a casa veste os calções e calça as sapatilhas para ir dar a corridinha da praxe.
"Todos os dias tenho de correr. Se não o fizer, não ando bem", explica António Martins, avançando que o "treino" tem a duração de "cerca de uma hora", o que não o impede de participar em provas de 30 ou 50 quilómetros, anotando que "já foi cabeça de cartaz em provas de trail em Espanha". "Muitas vezes consigo competir lado a lado com os mais novos e ainda me sinto capaz de conquistar mais algumas coisas", frisa o corredor, que andou a prova quase toda isolado na frente.
Convívio diferente na montanha
Há bem menos tempo neste mundo do trail está Isabel Lopes, 51 anos, consultora imobiliária. "Participo há cerca de três anos. Comecei muito antes nas caminhadas e depois comecei-me a entusiasmar, pois não tinha fotos das caminhadas só das corridas e comecei a ir para as corridas para tirar fotos e também para começar a correr um bocadinho", conta a atletas do Lion Runners da Guarda (Maia), acrescentando, entre risos: "Agora, caminho... corro. Caminho, caminho... corro. Caminho, caminho, caminho... corro".
O que Isabel Lopes adora é participar em competições de montanha. E justifica: "As provas de estradas saturam-me, mas nas de montanha estamos na natureza, vemos paisagens bonitas, o convívio é diferente e conhecemos pessoas novas. É um ambiente completamente diferente".
O clube que representa tem cerca de 50 elementos, e a grande maioria passa os fins de semana a participar em provas. "No domingo passado, no Trilho das Fisgas de Ermelo, estivemos 30 e tal e no próximo também vamos outros 30 e tal ao Marco de Canaveses. Há umas semanas fomos mais de 20 à Madeira competir no MIUT", refere Isabel Lopes, finalizando: "Isto é um vício".
"Porto Sentido" em peso
Um dos grupos que mais se destacou pelo elevado número de inscritos, foi o Porto Sentido Runners: 38 atletas participaram numa das três provas.
"A maior parte dos elementos é de Gondomar, de muito perto da zona de Melres, pelo que já conhecemos o local. Temos a experiência do ano passado. Correu bem, gostamos desta zona e é isso que nos traz cá", disse Avelino Rodrigues, 44 anos, um dos "coordenadores" do clube.
Apesar deste grupo conhecer bem os trilhos dos "Caminhos de Mellares", à partida para a prova não esperavam grandes resultados. "Em termos individuais a nossa equipa não tem grandes atletas. Em femininos, por escalão somos capaz de ter algumas hipóteses", anotou Avelino Rodrigues.
Retemperar energias
Os trails não são só obstáculos, esforço e muito suor. Ontem, após vários quilómetros a subir a pique, os exaustos atletas depararam-se com um pequeno oásis repleto de apetecíveis iguarias para retemperar as energias perdidas.
"É um pequeno abastecimento de sólidos e líquidos para os atletas que chegam aqui a cima [a pouca distância do ponto mais alto]. Temos frutas, salgados, bolachas, água, isotónicos. Tudo o que eles necessitam para continuar a viagem", explica ao JN o voluntário José Ferreira, responsável pelo posto, avançando: "Nesta fase da prova chegam cansados e um pouco desidratados, e uns mais, outros menos, todos necessitam de líquidos. A cola dá um bocadinho mais de energia a quem precisa. Tudo é essencial para continuar com força".
Organização a cargo da Alma D'Ouro
Desde a marcação do trajeto para evitar desvios de rumo no meio da noite, passando pelo reabastecimento e terminando no caldo verde servido no final para aquecer o estômago, nada foi deixado ao acaso pela Alma D'Ouro, organizadora do evento.
"O facto de ser um percurso noturno trouxe dificuldades acrescidas, para nós e para os participantes. Para nós organizadores também é mais complicado porque além das fitas balizadores vermelhas e brancas que normalmente se utiliza, tivemos de colocar refletores", refere Jorge Madureira, responsável pela organização, avançando: "Daí o uso obrigatório de lanterna ou frontal, que incide sobre esses refletores e ilumina o percurso".
A prova de que a Alma D'Ouro está no caminho certo é a de que o evento tem vindo a desenvolver-se de ano para ano. "É a quarta edição e temos crescido com o acompanhamento dos nossos parceiros. Tivemos apenas 450 participantes, número máximo aceite pela organização, para garantirmos a qualidade do evento", finalizou.