As memórias da final de Sevilha são muito agradáveis para Jorge Costa, capitão do F. C. Porto nessa época dourada para o clube azul e branco. O antigo central viveu momentos inesquecíveis há 20 anos e diz, em entrevista ao JN, que o jogo com o Celtic foi um hino ao futebol, acrescentando que quem nunca viu a final deve procurá-la na internet.
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Passadas duas décadas, o que recorda da final de Sevilha?
De todos os jogos que fiz pelo F. C. Porto, esta foi a vitória que mais me encheu as medidas. Talvez por ter sido a minha primeira final europeia pelo clube, por ter sido disputada perto de Portugal. A minha família foi de carro para Sevilha. A chegada ao estádio foi divinal. Havia muitos adeptos do F. C. Porto, mas aquilo era um autêntico mar verde e branco, tal a quantidade de escoceses que lá estavam, todos com as cores do Celtic. Depois o jogo em si, o calor, o ambiente que se viveu nas bancadas... Foi uma final perfeita. Claramente, foi o jogo da minha vida.
O F. C. Porto era superior ao Celtic?
Olha-se sempre para o campeonato escocês como algo menor, mas em 2003 o Celtic e o Rangers tinham grandes equipas. Nesse ano e no seguinte, contrataram jogadores em Portugal, como o Capucho e o Pedro Mendes. Nós achamos sempre que somos os melhores do Mundo. Partimos como favoritos, talvez não tanto como na final da Champions com o Mónaco, em 2004, mas tivemos de sofrer muito. O Henrik Larsson era um belíssimo jogador, um dos melhores avançados da Europa e um dos que me custaram mais defrontar.
Como foi sofrer por fora depois de ter sido substituído na segunda parte?
Saí aos 70 minutos, devido a uma lesão, e claro que se sofre muito mais do lado de fora. Enquanto estamos lá dentro, deixamo-nos levar pelo jogo e é tudo mais simples porque dependemos só de nós. Quando se está de fora, dependemos de outros. Ainda por cima, aquilo foi um jogo de loucos. Foi um hino ao futebol e aconselho as pessoas mais novas, que não o viram, a vê-lo na internet. Eu já o vi várias vezes, sobretudo durante a pandemia, e sinto sempre uma enorme nostalgia.
Depois do 3-2, já no prolongamento, os minutos finais custaram a passar?
Agora que recordamos tudo calmamente, sabendo que o resultado já não vai mudar, penso que controlámos bem o jogo. A nossa equipa era tecnicamente fenomenal e os jogadores tinham uma relação com a bola acima da média. O Celtic era fortíssimo em termos físicos, mas a nossa forma latina de jogar fez com que controlássemos bem. Para mim, que estava de fora, os minutos finais demoraram uma eternidade.
Levantou a taça juntamente com Vítor Baía. Qual foi a sensação?
Foi uma sensação única. Eu já tinha sido campeão do Mundo de sub-20 e ganho vários troféus pelo F. C. Porto, mas conquistar um título europeu pelo clube do coração é inexplicável. Cresces a ver jogar Madjer, Gomes, Juary, depois jogas com muitos desses jogadores, começas a ganhar títulos e ali estás a viver algo com que sempre sonhaste. Estávamos habituados a ver as finais europeias de chinelos e de calções, já de férias no Algarve.
A festa nas Antas atraiu dezenas de milhares de pessoas a altas horas da madrugada...
Vivemos as horas que se seguiram à final de forma muito especial. Prolongámos a festa por uns dias valentes. A cidade merecia. Naquela noite, houve muitos adeptos que não estavam porque tinham de fazer a viagem de regresso de Sevilha, mas ainda assim foram milhares às Antas. Foi uma festa incrível e diferente de todas as que eu tinha vivido antes.
A vitória de 2003 fez-vos acreditar que era possível ganhar a Champions no ano seguinte, como veio a acontecer?
Com todo o respeito pelos adversários, naquela época nós entrávamos em campo a pensar por quantos é que íamos ganhar. Tínhamos uma equipa com muita qualidade e jogávamos melhor do que os outros. As coisas foram acontecendo desde o início. O grupo era fantástico e o José Mourinho também foi fantástico a gerir tudo e a retirar-nos a responsabilidade de ter de ganhar aquela Taça UEFA. Costumo dizer que, a nível de qualidade futebolística, a equipa de 2003 era melhor do que a de 2004. Ganhar a final de Sevilha foi o clique para acreditarmos que, mesmo com um orçamento mais baixo do que os clubes mais poderosos da Champions e a jogar num campeonato menos competitivo, podíamos lá chegar. Esses dois anos foram uma prova inequívoca de competência.