Durante muitos anos, existiu a ideia que apenas os jogadores altos e fortes singravam. Hoje, o futebol prova o contrário.
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João Neves tem sido um dos jogadores em maior ascensão no Benfica. Com 1,74 metros suscitou muitas dúvidas no início da época, mas o médio tem provado que o talento não se mede aos palmos. Há outros casos flagrantes no futebol atual como Messi, um dos melhores de sempre que apenas mede 1,70 metros e destila veneno em qualquer parte do campo, há ainda Pedri (1,74 m), o farol do Barcelona, e a raça de Otávio (1,72 m), um dos jogadores mais importantes do F. C. Porto. Ou ainda a velocidade de ponta e o estilo driblador de Marcus Edwards (1,68m), o desequilibrador do Sporting. Na Liga, o mais baixo é Vasco Sousa, do F. C. Porto, com 1,62 metros.
O JN decidiu questionar o treinador João Henriques e o médio Rúben Ribeiro (1,74 metros) sobre a questão da altura no futebol moderno. Durante muitos anos, os treinadores preferiam futebolistas com um maior porte físico, capazes de vencer qualquer duelo como Patrick Vieira (1,93 m) e Yaya Touré (1,88 m) duas torres que dominaram, respetivamente, o meio-campo de Arsenal e Manchester City. Porém, com o passar do tempo, assistiu-se a uma mudança de paradigma. Cada vez mais importa a relação de um jogador com a bola, o ritmo imposto ao jogo, sobretudo porque os treinadores atuais preferem um estilo de futebol mais apoiado, de posse, e com claro protagonismo para a bola e não para o físico.
Um bom exemplo disso, destacado por Rúben Ribeiro, é o de Lionel Messi. "É um dos melhores de sempre e não é alto. Um jogador de estatura mais baixa é mais versátil, cria mais dificuldades ao adversário para roubar a bola e não permite que este entenda quando vai mudar de velocidade. É mais irreverente e difícil de marcar", explicou, ao JN, o jogador do Hatayspor.
A nível internacional, há muitos casos de jogadores de baixa estatura que são craques. Kanté mede 1,71 metros e, como médio defensivo, foi preponderante nas conquistas do título inglês no Leicester e Chelsea, tendo sido eleito o melhor jogador da Premier League. Há outros exemplos como Xavi, Iniesta e, mais atualmente, Pedri e Gavi, que brilham no Barcelona e personificam a cultura do "tiki-taka", que tanto sucesso trouxe ao clube.
No futebol português, além de João Neves, há o caso de Otávio, do F. C. Porto que, com 1,72 metros, tem sido essencial para Sérgio Conceição e é um dos jogadores mais intensos da Liga. "Seja nos duelos aéreos ou pelo chão, o que conta é a intensidade e eficácia nos desarmes, não é a altura. Ao longo da minha carreira tive de ser mais rápido que os adversários porque eram quase todos mais altos que eu", adianta "RR".
Mas como se explica a ascensão de um jogador baixo? Para Rúben Ribeiro, o importante "é a qualidade e aproveitar o momento em que é lançado". E João Neves é um bom exemplo que a qualidade não se mede.
Baixinhos na Liga
João Neves (Benfica), médio, 1,74 metros
Otávio (F. C. Porto), médio, 1,72 metros
Marcus Edwards (Sporting), avançado, 1,68 metros
Ricardo Horta (Braga), avançado, 1,73 metros
Nico Gaitán (Paços de Ferreira), médio, 1,74 metros
Salvador Agra (Boavista), avançado, 1,66 metros
Craques baixinhos
Lionel Messi (PSG), avançado, 1,70 metros
Luka Modric (Real Madrid), médio 1,72 metros
Bernardo Silva (Manchester City), médio, 1,73 metros
Antony (Manchester United), avançado 1,72 metros
Entrevista a João Henriques
Para um futebolista singrar tem de ser alto? Esta é uma ideia desmitificada?
Sim. Para mim, é importante que um jogador seja inteligente, capaz de solucionar problemas. A inteligência sobrepõe-se à estatura física. Claro que depende de como a equipa jogue, mas não acredito que para um treinador a altura seja algo relevante ou decisivo.
Em relação aos últimos anos, houve uma mudança de pensamento em relação à altura?
Penso que sim, foi a evolução natural do futebol. Os treinadores procuram mais ter a posse de bola e começar a jogar desde trás. Para isso, aquilo que impera é a qualidade técnica do jogador, o conhecimento de jogo, a tomada de decisão... tudo aspetos mais importantes que a altura de um futebolista.
Hoje em dia fala-se muito da questão da intensidade...
É verdade, mas um jogador mais baixo também consegue ser intenso. Seja nos duelos aéreos ou pelo chão, um futebolista baixo usa outras armas como a velocidade de execução, de deslocamento e o posicionamento. Para ser intenso na disputa de duelos é mais importante o conhecimento do jogo do que a altura.
Um jogador baixo tem de trabalhar mais que os outros?
Tem de fazer um trabalho complementar, invisível ao olho do adepto, que permite que o jogador consiga estar preparado para ser intenso e bom nos duelos com jogadores mais altos.
Os treinadores têm preferência por jogadores baixos ou altos?
Não é um fator decisivo. Tem que haver diversidade, dependendo das posições e preferências do treinador, se este quer uma a equipa com controlo da bola ou um perfil mais físico. Não se pode dizer que todos os jogadores têm de ser bons tecnicamente e que não interessa a altura, até porque há quem seja alto e bom com bola.