Vencedor da edição de 2013 da prova de estrada mais dura do mundo, Carlos Sá aceitou o desafio de regressar ao Vale da Morte, lançado pelo maior candidato ao primeiro lugar.
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Há um mês, ao galgar as montanhas do Gerês, o ultramaratonista português Carlos Sá passou o tempo a dizer ao amigo americano que andava a guiar numas férias de corrida por Portugal: "Anda lá Harvey, anda lá!" Harvey Lewis, 4.º classificado na Badwater de 2013 - a mais dura prova de estrada, 217 km sob temperaturas a beirar os 50 graus, ganha pelo português - respondeu-lhe com um sorriso: "Carlos, um segundo lugar atrás de mim seria mesmo muito bom. Devias mesmo considerar voltar a Badwater este ano".
Carlos Sá pensou, ouviu notícias da prova, percebeu que em termos de imagem internacional só teria a ganhar. "Não fazia sentido o vencedor do ano passado não ir", contou ao JN, horas antes da partida para a Califórnia. E, assim como assim, tinha previsto voltar em 2015, para bater o próprio tempo (24 horas, 38 minutos e 16 segundos), coisa com que nem vai precisar de se preocupar, dado que o percurso sofreu alterações e já não arranca do insuportável deserto do Vale da Morte.
Pronto a defender o título? O atleta admite que tem andado "a colocar as energias todas no Ultra Trail do Monte Branco", que decorre nos Alpes, a 29 de agosto, pelo que não fez "o treino específico" que cumpriu em 2013. Mas a corrida, garante, "não depende só disso".
A nível físico, no ano passado estava pronto. "Mas estava muito ansioso, não conhecia o percurso, não sabia de conseguiria, havia a temperatura, a distância, tinha problemas gástricos. Não sabia como o corpo ia responder. Bastava uma bolha logo no início para pôr em causa a prestação.."
"Parto mais tranquilo", diz-nos Carlos Sá, com a calma que o caracteriza. Recorda, a propósito, a última Maratona das Areias. "Não ia na melhor forma física e fiz o meu melhor tempo".
Leva auto-confiança e uma equipa que a reforça ainda mais: o médico e corredor Pedro Amorim, a ultramaratonista Carla Mendes e dois dos americanos que estiveram com Harvey Lewis no Gerês, a picá-lo, Nick LaBoffe e Joe Hamilton. Além de serem parte da equipa, apoiam a própria viagem, cujo custo ascende aos 8000 euros.
A partir das 6 horas de segunda-feira (14 horas em Portugal), vai ver-se quem ganha a batalha, se "a cabra montês", como lhe chama Harvey, se o "dragão interior" do americano que anda a treinar há meses. Paulo Pires, treinador, de Sá, corrige Harvey: "O Carlos é um leão, boa sorte". O próprio admite que é "difícil". Mas promete "dar o melhor".
"Ando em busca dos meus limites, felizmente ainda não os encontrei"
Desafios são coisa que não faltam ao ultramaratonista, que tem já a 29 de agosto a grande prova de fogo para a qual espera conseguir recuperar. Carlos Sá já esteve três vezes nos 168 km do Monte Branco, prova rainha da modalidade de trail running e que sujeita os atletas a um desnível de perto de dez mil metros. Arrecadou um 5.º lugar, um 4.º e uma desistência. Está-lhe assim como que atravessado. "Há 30 atletas que podem, qualquer um deles, ficar nos três primeiros. Eu estou entre eles".
Depois dos Alpes, o português andará um mês atarefado na organização do Grande Trail da Serra de Arga (27 e 28 de setembro), que, admite, "é um bocado desgastante". Passados dois dias, arrancará para uma estreia. A Jungle Marathon está na lista das provas mais difíceis do mundo e junta um grupo restrito de destemidos na Amazónia brasileira, para uma corrida de 254 km que parte dia 5 de outubro para seis etapas através da selva.
"É daqueles desafios que encaro bem e acho que posso ter um bom desempenho", diz Carlos Sá, que teve uma experiência parecida em fevereiro, no Coastal Challenge da Costa Rica. O problema não será a distância, mas as condições da prova: terá de se adaptar a temperaturas acima de 40 graus e a uma humidade muito próxima dos 100%. "Este ano é o décimo aniversário da prova. Convidaram-me". Aceitou. Porque, como diz Carlos Sá no perfil da sua página: "Ando em busca dos meus limites, felizmente ainda não os encontrei".