Vítor Baía praticamente dispensa apresentações. Com 33 troféus conquistados na carreira, ao serviço do F. C. Porto e do Barcelona, é um dos jogadores mais titulados da história do futebol. Na seleção também escreveu uma página de ouro, mas faltaram-lhe conquistas. Embaixador da Liga das Nações, o antigo guarda-redes revelou ao JN as suas expectativas para a competição.
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Após 13 anos a defender a seleção portuguesa, qual o sentimento de ser hoje um dos seus embaixadores?
De orgulho e também de responsabilidade, na divulgação de uma competição que queremos que seja exemplar.
Terem-no "chamado" deixou-o naturalmente feliz.
Foi, acima de tudo, um sinal de reconhecimento. Vale sempre a pena sermos dedicados e sérios. A minha carreira acabou por dar também uma ajuda importante. O que atingi foi notável, depois de muitos títulos e vitórias. Só tenho pena que a nossa geração, denominada de geração de ouro, não tenha conseguido um grande título para Portugal.
Já falaremos do passado, agora vamos focar-nos no presente. Portugal tem boas hipóteses de conquistar a Liga das Nações?
Por jogarmos em casa, com o 12.º jogador do nosso lado, considero que há uma percentagem maior de favoritismo. Além do valor da nossa seleção, temos a estreia do Ronaldo nesta competição. Ao ter o melhor do Mundo, as expectativas também são mais elevadas. Queremos uma meia final perfeita para conseguir atingir a final. E, como nós sabemos, as finais não se jogam, ganham-se [risos].
Falou de Ronaldo, mas, olhando para os seus números, chegamos à conclusão de que teve uma das épocas menos produtivas dos últimos anos...
...Não tenho dúvidas de que vai estar ao seu melhor nível. Ronaldo é um animal competitivo, uma máquina. Quando se tem o melhor do Mundo, tudo pode acontecer. A sua temporada foi de grande coragem. Saiu de uma zona de conforto, de uma equipa como o Real Madrid, e assumiu um novo projeto. E este projeto já o ganhou. Conseguiu ser o melhor marcador da equipa, sagrou-se campeão de Itália e, na Liga dos Campeões, também conseguiu feitos importantes, como, por exemplo, os três golos marcados na eliminatória com o Atlético Madrid.
Está otimista, portanto.
Quando se fala do Ronaldo, estamos sempre à espera que chegue à final de uma Champions. Como não conseguiu esta época, tem agora a sua Champions por Portugal, na Liga das Nações.
Apesar de ser uma mais-valia, há sempre alguém que critica Ronaldo.
... [abana a cabeça] É uma figura incontornável do futebol mundial. Temos é de dar graças a Deus por termos um jogador desta dimensão. Devemos tratá-lo bem, com carinho e com muito apoio, porque ele merece.
É o melhor português de sempre?
De Portugal, sem dúvida. No Mundo, está entre os três melhores de sempre.
Quem são os outros melhores?
Maradona e Pelé. Depois, temos o Messi. Quatro jogadores para três lugares, mas o Ronaldo está lá.
Em contraposição com Ronaldo, há uma vaga de sangue novo na seleção, em que se destaca João Félix. Pode ajudar Portugal?
O talento não tem idade. Desde que o selecionador considere que se trata do momento ideal, acho que faz muito bem. Os grandes talentos têm de ser utilizados e temos a sorte de ter um selecionador muito coerente.
Vê com bons olhos a hipótese de Ronaldo e Félix jogarem juntos?
Sim, porque não? Estamos todos na expectativa relativamente a essa questão.
A baliza tem estado bem entregue a Rui Patrício?
Muito bem entregue. O Rui tem evoluído muito e o Europeu deu-lhe consistência. Provou a sua valia no Wolverhampton, onde teve uma época extraordinária. Adaptou-se bastante bem porque não é fácil jogar fora do nosso país.
Chegou a trabalhar com Fernando Santos. Qual é a imagem que guardou do selecionador nos momentos mais exigentes?
Sim, fui pentacampeão no F. C. Porto com ele. Nos grandes momentos, é igual a ele mesmo. A sua tranquilidade passa para o grupo e é importante sentir isso no nosso líder. Em Portugal, há a ideia errada de que, para atingir o sucesso, as pessoas têm de ser agressivas, arruaceiras e malcriadas. É um erro, a competência não tem nada a ver com isso. As más imagens criadas ao longo dos anos têm obrigatoriamente de desaparecer. Não é o caminho certo.
Também foi colega de Pepe.
Sim. Fez uma boa época no F. C. Porto. No início, custou-lhe um bocado, porque esteve parado durante três meses, mas já está ao nível a que estamos habituados. É um dos líderes do grupo.
O primeiro jogo realiza-se num palco que conhece como as suas mãos. A atmosfera no Dragão pode ser decisiva?
Não tenho dúvidas absolutamente nenhumas. As pessoas do Norte vivem o futebol com grande paixão. Neste caso concreto, estamos a falar de Portugal e tenho a certeza de que serão ainda mais efusivos.
No último Mundial, Portugal terá acusado a pressão de ser o campeão europeu. O cenário pode agora repetir-se?
Não. Ser campeão europeu é uma sensação boa e retirou um peso de cima desta geração de jogadores. Nós sentimos isso e quando não conseguíamos atingir ainda sentíamos mais o peso dessa responsabilidade. Era uma frustração. Sem o peso da obrigatoriedade de ser campeão, porque já o é, o talento e a qualidade vêm ao de cima.
Portugal empatou em casa os últimos dois jogos.
São provas diferentes. A fase de qualificação é uma maratona, não começámos bem mas vamos recuperar, e a Liga das Nações é uma competição a eliminar, sem direito a erros. A abordagem ao jogo será diferente.
Como analisa a Suíça?
É muito física e ao mesmo tempo vertical. Vai ser um jogo de contacto mas Portugal terá de o evitar. Será um jogo psicologicamente duro.
Se Portugal vencer, prefere Holanda ou Inglaterra na final?
Se calhar, para a nossa forma de jogar, encaixaria melhor a Holanda. Por outro lado, a Inglaterra tem vindo a evoluir com o atual treinador. Desde que Portugal esteja na final, não devemos estar preocupados com o nome do adversário.
O que representaria para Portugal vencer a prova?
Muito. Seria o consolidar de uma gestão notável de Fernando Gomes. Hoje dá gosto ver a Cidade do Futebol. Quem nos dera a nós, antigos jogadores, ter este tipo de organização. Se calhar foi o que nos faltou para sermos campeões.
Vamos falar então do passado. Faltou uma melhor estrutura à geração de Vítor Baía?
Analisando as três vertentes, a qualidade dos jogadores, o treinador e a estrutura, o que mais se notou foi o amadorismo da estrutura da Federação. Se tínhamos jogadores e treinadores profissionais e uma estrutura amadora, é porque alguma coisa esteve mal durante esse período. A atual FPF é um exemplo para ser seguido, acima de tudo, pelos clubes portugueses.
É a segunda vez que Portugal vai receber uma competição internacional. Ainda hoje tem pena de ter falhado o Euro 2004?
Não, já passou e não sou pessoa de rancores. Estive com o senhor Scolari no ano passado, na entrega dos troféus Quinas de Ouro, e dei-lhe um abraço. Na altura, ficou prejudicado o senhor Scolari, fiquei eu prejudicado e ficou prejudicada a seleção. Mas é um tema que está mais do que ultrapassado, já nem penso nisso.
Hoje, tem uma relação cordial com Scolari?
Sim, cordial. Cumprimentamo-nos e respeitamo-nos.
Vai começar a exercer funções na FPF. Quais?
Vou iniciar um novo projeto, como apresentador do canal 11, de um programa desportivo.
Podemos saber mais detalhes?
Em breve se saberá [risos].
CV:
Data de nascimento: 49 anos (15-10-1969)
Troféus: Uma Champions, uma Taça Intercontinental, uma Taça das Taças, uma Taça UEFA, uma Supertaça europeia, 10 ligas portuguesas, nove Supertaças, cinco Taças de Portugal, uma Liga espanhola, duas Taças do Rei, uma Supertaça de Espanha