Começou a praticar ténis aos quatro anos, venceu o último Open da Austrália e lutou contra uma depressão. Ashleigh Barty era a número 1 mundial mas chocou tudo e todos esta quarta-feira ao anunciar a retirada da modalidade, aos 25 anos.
O grito da vitória foi denso, os punhos fechados provavam alívio e as lágrimas eram de quem não acreditava que tinha conseguido tal feito. Quando em janeiro Ashleigh Barty venceu a norte-americana Danielle Collins e conquistou o Open da Austrália - foi preciso esperar mais de 40 anos para voltar a ver uma australiana a levantar a Taça -, sem ceder um set em sete encontros, tudo indicava que a número 1 mundial ainda tinha muito para dar e ainda mais história a escrever na modalidade. Mas, afinal, acabou mesmo por ser uma despedida.
Sem competir desde então, a tenista, de apenas 25 anos, chocou tudo e todos esta quarta-feira ao anunciar a retirada definitiva do ténis. Num vídeo publicado nas redes sociais, Ashleigh revelou, em entrevista à ex-tenista e amiga Casey Dellacqua, que chegara a hora de deixar os "courts". "O dia de hoje é difícil e cheio de emoções, pois estou a anunciar minha retirada do ténis", vincou a australiana, admitindo estar "exausta" e considerando que já nada tem para dar à modalidade.
"Houve uma mudança de perspetiva em mim na segunda fase da minha carreira, em que a minha felicidade não dependia mais dos resultados. Sucesso, para mim, é saber que eu dei tudo que poderia ter dado pela modalidade. Estou plena, feliz e sei o quão trabalhoso é dar o melhor de mim. E eu não sinto mais isso, não sinto mais vontade de o fazer. Não tenho mais vontade emocional. Estou exausta. Fisicamente, não tenho mais nada a dar ao ténis. Estou feliz e tranquila com a minha decisão, pois dei tudo de mim. Agora, só quero aproveitar e ser a Ashley pessoa e não a Ashley atleta", disse em entrevista.
A jovem australiana lidera o ténis feminino há 119 semanas consecutivas, desde que conquistou o primeiro título do "Grand Slam", em Roland Garros, em junho de 2019. Depois de se juntar ao exclusivo grupo de vencedoras do "Grand Slam" em três superfícies distintas, a terra batida de Roland Garros, a relva de Wimbledon (2021) e o piso rápido do Open da Austrália (2022), Ashley despede-se com 15 títulos conquistados na curta carreira, um dos quais as WTA Finals, em 2019.
A atleta é a sétima jogadora que mais tempo permaneceu no comando do ténis mundial, só superada por Steffi Graf, Martina Navratilova, Serena Williams, Chris Evert, Martina Hings e Monica Seles, e a primeira a abandonar o topo do ranking desde a belga Justine Henin, em maio de 2008, quando também contava 25 anos e era campeã em título de dois torneios do "Grand Slam" (Roland Garros e Open dos Estados Unidos).
Tímida, reservada e apaixonada pelo desporto
Ashleigh Barty nasceu a 24 de abril de 1996 e é a mais nova de três irmãs. Filha de Robert, um antigo golfista amador de alta competição, o desporto sempre correu nas veias da tenista que pegou numa raquete pela primeira vez aos quatro anos. Aos cinco, começou a treinar depois de o treinador Joyce ouvir falar do talento da menina e convidá-la a ir até ao centro de treinos. Logo no primeiro dia, Ashleigh impressionou tudo e todos e começou a treinar com atletas com o dobro da idade. "A coordenação, concentração e maturidade delas eram incríveis", contou o treinador ao "Daily Mail."
Mais tarde, aos nove anos, a tenista começou a jogar contra rapazes seis anos mais velhos do que ela e, aos 12, começou a disputar jogos nos treinos já com adultos. Além do ténis, a australiana tinha um grande talento no golfe, tal como o pai, mas era com as raquetes que era mais feliz.
Tímida e muito caseira, Ashleigh começou a competir fora de casa com 14 anos. Ligava aos pais a chorar todos os dias, com saudades, mas o amor pelo desporto e o desejo de competir ajudaram-na a lidar da melhor forma com a distância da família. Tudo corria bem quando, em 2014, com apenas 18 anos, decidiu deixar o ténis. Ashleigh vincou que queria aproveitar para fazer "coisas normais de adolescente" e acabou por admitir que estava a lutar contra uma depressão. "Toda esta pressão, a imprensa... não consigo. Preciso de parar", disse na época. O pai, Robert, ficou triste com a decisão e, em entrevista, admitiu que sofria de bipolaridade e um transtorno obsessivo compulsivo. "Acredito que ela tenha herdado estes problemas de mim".
A australiana esteve afastada 17 meses do ténis - mas praticou cricket e também teve sucesso -, viajou, trabalhou com um psicólogo e acabou por regressar graças a uma iniciativa com jovens tenistas australianas, na qual voltou a jogar, e à amiga Dellacqua, que depois de a ver jogar, lhe mandou uma mensagem: "Olá querida. Boa decisão, vai à pesca". Ashleigh regressou revigorada aos courts, em 2016, e começou a escalar a hierarquia mundial até ao topo, sob a orientação do novo treinador australiano Craig Tyzzer.
Quando começou a pandemia de covid-19, em 2020, a australiana acabou por fazer nova pausa na carreira durante 11 meses e optou por permanecer na Austrália, abdicando de viajar pelo mundo para jogar os torneios do WTA, que retomaram em agosto do mesmo ano, após uma paragem de cinco meses. Em 2022, a despedida: Ashleigh conquistou o Open da Austrália e, dois meses depois, anunciou a despedida definitiva.