Há mais de meio milhão de trabalhadores independentes, 109 mil dos quais já terão sido apoiados, no contexto das ajudas criadas durante a pandemia, com um máximo de 635 euros, o valor do salário mínimo nacional.
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Ora, este é o valor mais baixo aplicável aos 4,2 milhões de trabalhadores por conta de outrem (dependentes), mais de 500 mil dos quais já estarão sob lay-off. Chegados a um 1.º de Maio cerceado pela crise sanitária, é visível que a "rede" não sustém a queda de todos de forma igual.
O rolo compressor da pandemia ainda não parou. Até meados deste mês, muito mais de meio milhão de trabalhadores já estarão a ser pagos pelo regime lay-off (suspensão ou redução do horário). Do lado dos independentes, havia ontem ainda cerca de 70 mil na fila de espera do apoio extraordinário da Segurança Social.
Opções políticas
"São evidentes as opções políticas tomadas. No caso dos independentes, que representam ainda uma parcela relevante do "coletivo trabalhadores" do país, nos quais encontramos muitos denominados "falsos recibos verdes", não se compreende o limite de apoio de um salário mínimo, quando no caso dos trabalhadores por conta de outrem, em situação de lay-off, o apoio é de 70% de três salários mínimos [1905 euros]", afirma Mário Barros, advogado da Saragoça da Matta & Silveiro de Barros.
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"No caso de dois trabalhadores que aufiram 1500 euros, o independente que parou de faturar terá o rendimento assegurado só pelo apoio, que é de 635 euros; já quanto ao trabalhador dependente em suspensão de contrato, o apoio da Segurança Social é de 700 euros, ficando ele a ganhar 1000 euros", exemplifica Mário Barros (ver quadros com simulações).
"Há uma desigualdade, mesmo que tenhamos em conta que entre patrão e trabalhador dependente há uma contribuição de 23,75% mais 11%, respetivamente, enquanto que o independente desconta 21,4% (o dobro do dependente)", lembra Eugénio Rosa, economista da CGTP.
No entanto, conforme recorda Mário Barros, no lay-off os empregadores ficarão isentos do pagamento das contribuições durante o período em que vigora o apoio (ou seja, 23,75%), para incentivo à manutenção dos contratos de trabalho. "No caso dos trabalhadores independentes, os mesmos apenas terão direito a uma moratória [sem juros] no pagamento das contribuições, tendo de pagar um terço nestes meses. O Estado não pode proteger 100% dos portugueses, mas não sei se o coletivo de trabalhadores independentes reduzidos a um apoio de salário mínimo é um limite adequado e se os aspetos contributivos não foram esquecidos", refere o advogado Mário Barros.
Eugénio Rosa recorda que o trabalhador independente não tinha e continuará a não ter subsídio de férias ou de Natal e que as empresas de trabalho de temporário que os recrutam ficam ainda com parte do seu rendimento. Mário Barros lembra também que quem acumulava trabalho dependente com independente, para assegurar um certo nível rendimento mensal, só pode agora ser inserido nos apoios do regime lay-off.
Questões técnicas
O apoio extraordinário à redução da atividade económica do trabalhador independente tem levantado múltiplas dúvidas aos visados.
Duas situações
Desde março, qualquer independente que tivesse uma quebra total de rendimentos podia ter um apoio até 438,81 euros, o valor de um Indexante de Apoios Sociais (IAS). A partir de abril, foi criado outro escalão para quem tivesse ganhos acima de 1,5 IAS (658,22 euros). Quem tiver quebras de faturação acima de 40% tem direito também.
Cálculo da quebra
A Ordem dos Contabilistas Certificados (OCC) explica num simples exemplo: para um pedido efetuado em abril (1 a 30 de abril), o independente tem de verificar a faturação de março em comparação com a média de janeiro e fevereiro. Por exemplo, faturou 500 nos dois primeiros meses e 200 em março. Quebra de 60% que dá direito ao apoio. Basta ter três meses consecutivos de faturação nos últimos 12 meses.
Base de incidência
Esta foi uma das grandes confusões. No âmbito deste apoio extraordinário, a base de incidência contributiva (BIC), que é de 70% do rendimento declarado, não conta aqui. "A Segurança Social apenas entra em consideração com o valor faturado (prévio ao apuramento da BIC)", refere a OCC.
Mínimo e máximo
Segundo a OCC, um independente com quebra total de rendimentos tem um apoio mínimo de 438,81 euros (1 IAS), sempre que a sua remuneração média perdida fosse inferior a 1,5 IAS. O valor máximo de apoio é de 635 euros.