Sindicatos unidos pela primeira vez denunciam que a Banca está a "despedir para contratar pessoal mais barato" em outsourcing.
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Os trabalhadores dos maiores bancos em Portugal estão a viver momentos de "terror psicológico" para aceitarem rescindir contratos ou antecipar reformas, denunciam os sete sindicatos do setor que convocaram uma manifestação para amanhã, às 16.30 horas, em frente à Assembleia da República. Apelam ao Governo para que trave os dois a três mil despedimentos planeados este ano, numa altura em que os bancos apresentam lucros e despediram cerca de 13 mil trabalhadores nos últimos seis anos. Acusam ainda os bancos de substituir trabalhadores experientes por "mão de obra barata, em regime externo".
"Estão a despedir quando falta pessoal - continua a haver trabalho recorrente em horas extraordinárias não pagas - e depois contratam pessoas sem formação, a ganhar o salário mínimo, em outsourcing", denunciou Mário Mourão. O presidente do Sindicato dos Trabalhadores do Setor Financeiro de Portugal admite que possa ser posto em causa o sigilo bancário e a segurança dos clientes com o aumento de trabalhadores externos. "Não têm formação, hoje são uns e amanhã são outros, sem estabilidade", revelou.
riscos afastados
A Associação Portuguesa de Bancos assegurou, ao JN, que "o eventual recurso ao outsourcing não diminui a segurança", uma vez que "os prestadores de serviços contratados pelos bancos ficam obrigados ao cumprimento das mesmas regras de sigilo bancário e de proteção de dados a que os bancos estão sujeitos".
Mesmo assim, os sindicatos recordam que "os bancos foram ajudados", mas em ano de pandemia "deram lucro e querem despedir". Por isso, sintetizou Mário Mourão, "o Governo deve intervir, porque esses desempregados vão passar a dar despesa ao Estado".
No ano passado, quatro dos cinco maiores bancos (BCP, Santander, Caixa Geral de Depósitos e BPI) lucraram 1075 milhões de euros e só o BPI não anunciou planos de reestruturação. O Novo Banco teve prejuízo, já eliminou milhares de postos de trabalho e mantém a porta aberta a novas saídas.
intimidação cresce
Os dirigentes sindicais asseguram ser generalizado o "clima de pressão e intimidação" nos bancos, com a agravante de "pela primeira vez, os maiores bancos [BCP e Santander] ameaçarem com despedimentos coletivos". Pedro Messias, presidente do Sindicato dos Trabalhadores das Empresas do Grupo Caixa Geral, recorda que "os despedimentos coletivos nunca estiveram em cima da mesa no setor, as saídas sempre foram negociadas".
Também no banco do Estado há "medo do que vem por aí". O plano de reestruturação acordado com Bruxelas devido à recapitalização, entre 2017 e 2020, eliminou mais de dois mil empregos na Caixa. "O plano estratégico 2021-2024 ainda é desconhecido, tal como o anterior foi, portanto não sabemos o futuro", lamenta Messias.
CEO diz que Fundo de Resolução penaliza bancos
O CEO do BCP utilizou "os injustos e irrazoáveis contributos que alimentam o mecanismo de capitalização do Novo Banco" [Fundo de Resolução] como argumento para a decisão de despedir trabalhadores, este ano. Miguel Maya explicou aos trabalhadores, aos quais endereçou uma comunicação interna, que as "contribuições por parte do BCP se aproximam dos 50 milhões de euros por ano e, em valor acumulado, já superaram os 400 milhões". No ano passado, o BCP apresentou lucros de 183 milhões de euros. O Novo Banco teve prejuízo de 1329,3 milhões.
BdP acha natural
Hélder Rosalino, administrador do Banco de Portugal (BdP), disse na Comissão de Orçamento e Finanças, há dias, que a redução de trabalhadores na Banca resulta da adaptação e resposta ao mercado pelo setor. "Julgo que tem vindo a ser feito com equilíbrio. Não me parece que haja aqui uma redução radical do número de trabalhadores do setor financeiro", disse.
"Desafios" grandes
O governador do BdP, Mário Centeno, considerou que a Banca tem "desafios muito grandes, desde a digitalização às baixas taxas de juro", daí estar justificado terem de "reduzir a força de trabalho".
À lupa
Reestruturação: BCP quer cortar mil
O BCP arrancou a 16 de junho com o plano de redução de cerca de mil trabalhadores, através de reformas antecipadas ou rescisões por mútuo acordo (sem subsídio de desemprego). Se não atingir os números desejados por acordo, ameaça despedir.
Cortes: Santander ameaça
Aprovado há duas semanas, o plano de reestruturação do Santander prevê a saída de 685 trabalhadores. Até ao próximo dia 15, receberão a proposta no correio e terão até ao dia 29 de agosto para aceitar ou rejeitar. Segundo os sindicatos, paira a ameaça de despedimento coletivo para quem rejeitar.
Plano: Novo Banco negoceia
O Novo Banco já eliminou 2200 trabalhadores entre 2014 e 2020, mas mantém abertas propostas de rescisão para quem aceitar.
Secreto: Estratégia da Caixa
A reestruturação da Caixa Geral de Depósitos obrigou à saída de 26% dos trabalhadores desde o final de 2016 (de cerca de 8100 para 6500, já este ano). Os sindicatos temem que o plano estratégico para 2021-24 traga "surpresas e despedimentos inéditos" no banco do Estado.
Montepio: Centenas de saídas
O Montepio ainda está a executar um plano de redução de 600 a 900 trabalhadores, tendo saído apenas 235 até agora.