Portugal é o 9.º país europeu com mais risco. Bancos estão a dificultar o acesso à taxa fixa.
Corpo do artigo
A subida das taxas Euribor está a ter impacto em 92% dos créditos à habitação contratados em setembro. Segundo o Banco de Portugal (BdP), que revelou, pela primeira vez este ano, o tipo de taxa dos novos créditos à habitação, o número de empréstimos com taxa variável continua esmagador no nosso país. A proporção de taxa variável nos novos créditos de Portugal é três vezes superior à da Zona Euro.
Em setembro passado, numa altura em que todas as taxas Euribor já estavam em subida vertiginosa, 92% dos novos créditos foram contratados com taxa variável, em que o valor da prestação mensal está sujeito à subida das taxas Euribor. Os dados do Banco de Portugal mostram que 5% das novas operações têm como taxa de juro a Euribor a três meses, 42% a seis meses e 45% a 12 meses. Só 8% dos novos créditos possuem taxa fixa, em que a prestação não altera, ou mista, em que a prestação inicial é fixa e, depois, passa a variável.
Os contratos de setembro são aqueles que estão mais expostos à subida da Euribor, pois, por regra, quanto mais recente é o crédito, maior é a proporção de juros na prestação.
Para Natália Nunes, coordenadora do Gabinete de Proteção Financeira da Deco, a grande proporção de créditos com taxa variável "constitui um risco".
Isto acontece porque os bancos apostam "na promoção da taxa variável", mas também "há falta de informação do consumidor", aliada "ao facto do rendimento das famílias ser muito baixo no momento em que estão a pedir o crédito". Ou seja, como a taxa fixa implica uma prestação maior do que a da taxa variável no momento inicial do crédito, parece pior. Só que, numa conjuntura de subida das taxas de juro, pode ser vantajosa.
"Muitos pedidos de ajuda"
João Cerejeira, economista e professor da Universidade do Minho, concorda que "não houve um papel pedagógico" dos bancos e do regulador, sendo que, do lado do consumidor, "há pouca perceção dos riscos associados e falta de informação". Por isso, "deve-se sempre perguntar as condições de transição" de fixa para variável, antes de assinar.
A Deco tem recebido "muitos pedidos de ajuda" de famílias com menos rendimentos. "São, sobretudo, as que têm taxas variáveis", diz Natália Nunes.
Segundo o Banco Central Europeu (BCE), Portugal é o 9.º país da União Europeia com maior proporção de taxa variável no total dos créditos à habitação. Em setembro, de acordo com o BCE, esta taxa representou 68,9% das novas operações, o que é três vezes mais do que a média da Zona Euro, que está em 23%.
A proporção de novos créditos com taxa variável do BCE e do BdP é diferente, pois o organismo europeu não considera os créditos com Euribor a 12 meses, que são revistos depois dos 365 dias. Para o BCE, a proporção de taxa variável é um "indicador de avaliação de risco" e, no que toca a Portugal, mantém-se inalterado há um ano, em valores que rondam os 69%. Isto, apesar da alteração da conjuntura dos juros.
O JN contactou a CGD, o Millennium BCP, o Santander Totta, o Novo Banco e o BPI. Nenhum revela quantos créditos foram renegociados nos últimos três meses e apenas o Millennium BCP informou qual a proporção de novos créditos com taxa variável no mesmo período. Foram 75%, abaixo da média nacional de 92%. Em outubro, o Santander suspendeu as negociações de créditos com taxa fixa.
VARIÁVEL
Estado não dá exemplo com dívida
A subida das taxas de juro vão ter impacto nas contas públicas e "Portugal pode estar em maior risco" do que a maioria dos países europeus, revela João Cerejeira. Isto porque o Estado "também não deu o exemplo" e prolongou pouco o prazo da sua dívida, o que significa que "vai estar sujeito às variações".
NOVAS REGRAS EM VIGOR EM 2023
Reavaliação da taxa de esforço
Os créditos à habitação inferiores a 300 mil euros podem ser renegociados sem penalizações quando a taxa de esforço (percentagem do rendimento mensal destinada à prestação) ultrapasse os 36% ou suba 5% face ao início do contrato. A renegociação só é obrigatória quando a taxa de esforço ultrapassar os 50%.
Isenção da comissão de amortização
A comissão que o cliente tinha de pagar sempre que amortizava um crédito de taxa variável vai ser suspensa. Era de 0,5% do montante amortizado. Se o contrato tiver uma taxa de juro fixa, a comissão de amortização é de 2% e não foi suspensa.
Retenção na fonte de IRS reduzido
Os trabalhadores por conta de outrem com vencimentos brutos mensais até 2700 euros que tenham crédito à habitação podem beneficiar da redução de um escalão na taxa de IRS. Para que possam aderir e beneficiar da medida, devem solicitá-lo à entidade patronal.