Testagem obrigatória desmobiliza clientes e há espaços quase vazios ao fim de semana. Há quem prefira encerrar do que estar a gastar luz.
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No primeiro fim de semana em que vigorou a obrigatoriedade de apresentar teste negativo à covid-19 para aceder aos espaços de diversão noturna, o prognóstico não é animador: com os clientes a fugir para evitar os testes ou porque não conseguem fazê-los, há bares e discotecas que vão optar por fechar as portas durante este mês, de forma a evitar mais prejuízos, revela ao JN a Associação Nacional de Discotecas.
José Gouveia, que lidera a estrutura associativa, afirma que o fenómeno ocorre "um pouco por todo o país, do Minho ao Algarve", embora ainda não disponha de números. "Os espaços estão abertos, mas a grande maioria não tem clientes, e muitos já decidiram fechar em dezembro. Para abrir para quatro pessoas, preferem encerrar", diz o representante dos empresários da noite, referindo que, no sábado, "seis casas anunciaram que vão encerrar temporariamente e outras tantas pensam fazer o mesmo".
Negócios em risco
Madrugada de sexta-feira. A chuva era miudinha e persistente, mas pouca gente molhava pelas zonas de animação noturna da Baixa do Porto. O corrupio da movida evaporara e nas pistas de dança de bares e discotecas a música era para pouco mais do que uma dezena de almas.
Eram 2 horas quando Mário Carvalho deu ordem para fechar o Café Lusitano, que estava a "10% da capacidade". "Isto é impensável, não dá para nada, e mais vale fechar mais cedo do que estar a gastar mais luz e água", avaliava o empresário que, na passada quarta-feira, dia em que entrou em vigor a nova restrição, registou a entrada de "oito pessoas", apesar do feriado. "Não havia praticamente ninguém na rua", lastima.
Mário Carvalho não esconde que "o negócio já está em risco há muito tempo" e que "a única coisa que o mantém são financiamentos bancários". E "não há perspetiva de recuperação com esta incerteza e instabilidade toda", lamenta, vincando que "é surreal lançar uma medida destas e pôr as casas numa situação de poderem abrir mas não terem ninguém".
Porto apoia 20 espaços
"Vai ser muito mau. Estivemos fechados, e estávamos agora a tentar levantar voo. Mas estamos neste impasse: os clientes não aparecem; não há testes à venda e não há quem os faça", queixa-se Carlos Machado, dono da discoteca Griffon's, na zona das Galerias de Paris, um dos 20 estabelecimentos que viram aprovada a candidatura ao programa de apoio "Luz para a noite do Porto", para o qual foi ontem decidida, em reunião de Câmara, a atribuição de uma verba de 600 mil euros. Também aprovada foi a entrada em funcionamento dos centros onde serão disponibilizados gratuitamente 100 mil testes antigénio à covid, até ao final do mês.
Testes insuficientes
"O Governo não antecipou as dificuldades que ia ter com a medida que tomou, e isso é que é inacreditável", critica José Gouveia, que defende que a imposição da testagem deveria ter sido "adiada para janeiro". Quer para haver tempo para aprontar meios para a realização de testes em massa, quer para salvaguardar os negócios. "Para estas empresas, dezembro corresponde a um terço da faturação anual, e isto foi a machadada final para este setor", antevê o líder da Associação de Discotecas.
"Lisboa criou cinco centros de testagem que são insuficientes. Houve pessoas que estiveram duas a três horas à espera. E para beber um copo vou ficar esse tempo todo à espera de um teste?", questiona, lembrando que "não há stock para esta vaga de testes".
"Há clientes que vão todos os dias a um bar", alerta o presidente da Associação de Bares da Zona Histórica do Porto, convicto de que a medida "tem desmobilizado muita gente", porque "nem todos têm disponibilidade para fazer o teste".
Alguns estabelecimentos instalaram postos de testagem à porta - como o Eskada e o Maus Hábitos, no Porto, e o Sal em Aveiro com testes grátis -, mas o presidente da Associação de Discotecas recorda que "o investimento médio ronda os 1500 a 2000 euros por dia", despesa que se soma às "quebras de faturação" que já não serão minimizadas neste mês. "O Governo criou uma norma impraticável, e tem de rever isto", conclui José Gouveia.