Os países da União Europeia que têm cargas horárias semanais mais leves revelam índices de produtividade superiores.
Corpo do artigo
A Irlanda, o mais produtivo, tem uma média de 36,5 horas, menos três do que em Portugal, mas a produtividade é quase o triplo da nossa. Os Países Baixos têm a menor carga horária e, ainda assim, uma produtividade superior à média europeia.
Lanchar, tomar café ou fumar fazem parte do tempo de serviço em Portugal, de acordo com a interpretação de especialistas. Ou seja, dificilmente um tribunal daria razão à Galp se esta empresa tentasse impor cá, tal como fez com sucesso em Espanha, o desconto dessas pausas no tempo de trabalho. Ainda assim, os sindicatos estão a tentar fixar esses períodos nas contratações coletivas para garantir que mais empresas promovem a saúde e previnem acidentes, sobretudo nos setores de mão de obra intensiva.
Bom senso impera
"As pausas para fazer pequenas refeições, tomar café, fumar, ou até para as necessidades fisiológicas do trabalhador estão incluídas no conceito de tempo de trabalho", na análise de Eduardo Castro Marques, especialista em Direito Laboral na sociedade Cerejeira Namora, Pedro Marinho Falcão & Associados. O advogado refere que "no caso português, tem imperado o bom senso" e que "uma decisão como a proferida pelo tribunal espanhol, relativamente à Galp, dificilmente poderia ser adotada em Portugal". Contudo, reconhece que "o esforço empresarial no sentido do aumento da produtividade tem-se traduzido amiúde na imposição de maiores cargas horárias aos colaboradores das empresas, com resultados contraditórios: o excesso de trabalho, além de não se materializar em incrementos de produtividade, tem gerado situações de "burnout" ou esgotamento laboral e, ainda, em elevadas taxas de absentismo".
Ainda que as pausas sejam legais, sem estarem rigorosamente fixadas pelo Código de Trabalho, os sindicatos procuram ir mais longe: exigir mais pausas ativas.
"Há empresas onde as pausas estão reguladas na contratação coletiva, isto é, o período da manhã e o da tarde em que é permitido parar, tomar um café, por 10 ou 15 minutos", explica Rogério Silva, coordenador da Fiequimetal, o sindicato dos trabalhadores das indústrias químicas, e membro da comissão executiva da CGTP. "Nos últimos tempos temos vindo a exigir a implementação de mais "pausas ativas" para diminuir a incidência de doenças profissionais e de acidentes de trabalho", acrescenta, explicando que o objetivo é levar os trabalhadores a "circular pelas áreas de descanso".
Rogério Silva identifica os setores automóvel e de componentes elétricos para o setor automóvel, bem como os serviços de call center como os mais carenciados de pausas reguladas. Danilo Moreira, presidente do Sindicato dos Trabalhadores de Call Center, diz que, depois da petição de há um ano pelo reconhecimento da profissão, que ainda não teve desfecho legislativo, "a situação está melhor nalgumas empresas e não mudou nada noutras". Os operadores reclamam pausas de seis minutos a cada hora trabalhada e a diminuição da jornada diária.
O sociólogo Elísio Estanque recorda que o problema sente-se, geralmente, "nos setores mais tradicionais, como o têxtil ou o calçado", sendo o episódio da Galp em Espanha "sinal dos tempos, em que temos vindo a assistir a um recuo no direito dos trabalhadores, ditado pela necessidade de competitividade das economias". E afinal, "quanto mais trabalhamos menos produzimos", sublinha o investigador.
Estudos
Jornadas seguidas sem parar acabam por ser piores
Vários estudos internacionais falam sobre a importância das pausas para a produtividade, quer em setores de trabalho intensivo (indústria, tipicamente, mas também call centers, por exemplo) quer em trabalhos intelectuais. Praticamente todos os estudos recomendam pausas por cada hora de trabalho, de 15 minutos para o trabalho intelectual, cerca de dez para outras ocupações. O empreendedor e guru da inteligência emocional Travis Bradberry garante que a jornada laboral de oito horas sem descanso não é produtiva e recomenda 52 minutos de trabalho seguidos de 17 minutos de pausa. As pausas devem ser ativas: aproveite para caminhar, tome café e converse sobre trivialidades para desligar o cérebro do trabalho.
Casos
Sentença
Um tribunal espanhol decidiu, numa sentença conhecida em meados de fevereiro mas que foi proferida em dezembro de 2019, que a Galp Energia Espanha pode deduzir ao cálculo efetivo da jornada de trabalho o tempo em que um trabalhador toma o pequeno-almoço, bebe um café ou fuma um cigarro.
Recurso
A Confederação Sindical das Comissões Obreras (CCOO) recorreu ao Supremo Tribunal por causa daquela decisão favorável à empresa. A Galp rejeitou aplicar a mesma medida em Portugal, porque a legislação espanhola que o permite "não tem paralelo em Portugal".