Pacto estabelecido com 11 empresas de referência do setor busca valorização e melhoria da qualidade de trabalho dos engenheiros que operam na região.
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Num ato inédito dentro do setor da engenharia, a Ordem dos Engenheiros - Região Norte (OERN) assinou, na passada quarta-feira, um pacto com onze empresas nortenhas de referência, que, por junto, faturam dois mil milhões de euros e empregam três mil engenheiros. Em entrevista, Bento Aires, presidente da OERN, explica que o documento, resultado da auscultação a dois mil profissionais do setor, aponta para a imperiosa necessidade de fixar engenheiros em Portugal e de promover o regresso ao país daqueles que entretanto emigraram. Ao Governo cabe, igualmente, ser mais criterioso nas obras públicas, valorizando a compra de qualidade em detrimento da compra mais barata.
Que balanço faz do lançamento do pacto?
O balanço é muito positivo. Este foi o primeiro passo para a construção de uma nova visão da engenharia na região Norte. Conseguimos motivar 11 empresas de engenharia e de referência da região Norte, que representam mais de dois mil milhões de euros de volume de negócios e mais de três mil engenheiros, a comprometerem-se com uma estratégia conjunta de valorização e de melhoria da qualidade de trabalho dos engenheiros do Norte. Para o estabelecimento desta ação ouvimos os engenheiros, numa auscultação com mais de dois mil respostas e com resultados surpreendentes. Ao contrário da perceção que tínhamos, os engenheiros são bem remunerados. Apenas 10% estão insatisfeitos com as suas condições de trabalho.
Qual é o objetivo do pacto?
Queremos que os engenheiros na região Norte se diferenciem e tenham melhores condições de trabalho. Que estas empresas continuem a contratar melhor. Queremos que os engenheiros sejam valorizados, preparados para os desafios do futuro e que a região Norte seja a referência da nova engenharia que, em conjunto, vamos construir. Enquadrado na missão da OERN e nas intenções e diretrizes estratégicas atuais, o pacto servirá de base ao desenvolvimento de ferramentas necessárias à qualidade e valorização do trabalho dos engenheiros e, por conseguinte, contribuirá para a fixação e regresso dos engenheiros a Portugal.
Quais são os próximos passos?
O primeiro passo é abrir o pacto à adesão voluntária de todas as empresas de engenharia com sede e influência na região Norte. Dentro dos compromissos do pacto, as empresas partilharão com a OERN os seus indicadores relacionados com o âmbito do pacto, o que nos permitirá dar um sinal ao mercado do valor dos engenheiros. A Ordem, em conjunto com as empresas, irá suportar e apoiar o desenvolvimento e capacitação dos engenheiros através de planos de desenvolvimento profissional, formação contínua e boas práticas.
A “fuga” de engenheiros para o estrangeiro abriu falhas relevantes no mercado?
A auscultação que fizemos demonstrou isso mesmo. Temos muito poucos engenheiros com menos de cinco anos de experiência profissional, o que é fruto de uma crise de vocações para as engenharias, sobretudo as tradicionais, o que nos preocupa pelo comprometimento de uma geração de engenheiros. Não é possível fazer com que as pessoas não saiam do país, mas o que nos propomos fazer com os que saíram é que tenham motivos para quererem voltar a trabalhar no país e inverter as consequências da fuga.
É possível estimar quantos engenheiros faltam em Portugal?
Até poderíamos dizer que não há falta de engenheiros, mas assumir isso seria comprometer o nosso futuro coletivo. Há muita falta de engenheiros nas engenharias clássicas, bem como nas novas engenharias. Quanto às clássicas, estas são cruciais para a execução do PRR, para resolver a crise da habitação, para a transição energética, para construir a linha de alta velocidade e até mesmo o novo aeroporto. Quanto às novas engenharias, se queremos ter um país à prova de futuro, é preciso formar talento, retê-lo e valorizá-lo para termos unicórnios estáveis e duradouros de base na engenharia.
Que medidas legislativas seriam necessárias para colmatar o problema?
O problema não se resolve apenas com benefícios fiscais aos engenheiros e às empresas. O Estado é cliente e patrão, e aqui tem muito a fazer para colmatar o problema. Como, por exemplo, ser mais exigente na escolha dos seus fornecedores, valorizando a compra de qualidade em detrimento da compra mais barata, bem como procurar ser um referencial laboral, o que não é neste momento. Enquanto os governos não perceberem que o desenvolvimento do país depende de algumas classes profissionais, entre as quais nos enquadramos, continuaremos a falhar. Estaremos condenados a acreditar num passado de conquistas e num presente com fracas expectativas. Daí a importância de pactos como este.