Criadores sem pastos duplicam gastos com feno e rações. Para não deixarem morrer forragens, há quem gaste 600 metros cúbicos de água por mês.
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Pela primeira vez em 20 anos de exploração agropecuária, Júlio Ambrósio foi forçado a acionar o sistema de rega das pastagens logo em janeiro. O que era um procedimento pontual durante o mês de agosto passou a ser crónico devido à seca. "Atualmente ligo o sistema três dias por semana durante dez horas", precisa o pastor que gasta 1600 metros cúbicos de água por mês para não deixar morrer as forragens de vez.
"Já devíamos estar a guardar pastos para colher forragens pelo S. João e junho e já estamos a comprometer a alimentação do próximo inverno", evidencia o homem que possui 1020 cabeças de gado e tem na aldeia de Prados, Celorico da Beira, o maior rebanho de ovelhas bordaleiras de toda a área demarcada da serra da Estrela.
Mas o gasto fora de todas as previsões não é o único fator a entrar na equação e a agravar os custos de produção.
Milhares em feno
Sem chuva a temperar os solos habitualmente férteis, o pastor, que tem uma atividade empresarial consolidada, consumiu nos últimos três meses 42 toneladas de feno com um custo superior a três mil euros e já encomendou outro tanto. Já para não falar dos gastos com ração que, em pouco tempo, passou de 100 para 150 quilos por dia. "E como o preço duplicou, a despesa galgou de três para seis mil euros a cada três meses", conta com amargura.
"O valor do leite e da carne de borrego subiu, mas não o suficiente para cobrir o aumento dos custos de produção", quantifica o pastor que, por ser também um homem de negócios, não deixa de fazer contas. "Um ano mau ainda se aguenta, mas outro igual, duvido", diz.
Ser criador de gado no atual contexto é difícil e pouco compensador na medida em que as ovelhas produzem menos leite e de qualidade inferior à necessária para fazer o afamado queijo da serra da Estrela.
Leite com quebras de 50%
"A produção caiu para metade", garante o pastor de prados. É leite com menos gordura que Júlio Ambrósio drena para a Casa Agrícola dos Arais, propriedade da mulher, que também possui 220 ovelhas e produz pelo menos 20 toneladas de queijo por ano. Presença habitual das feiras, Célia Silva é uma das mais importantes embaixadoras do genuíno queijo da serra dentro e fora do concelho. Aliás, em 18 expositores representados este fim de semana na feira do queijo, que decorre em Celorico da Beira, Célia Silva é uma das quatro queijeiras que exibem produto com Denominação de Origem Protegida.
Apoio a produtores
A poucos dias de realizar também o certame de divulgação do queijo, a Câmara de Gouveia anunciou que vai apoiar os 300 produtores de gado afetados pela seca severa com 50 mil euros. Na deliberação aprovada em reunião do Executivo camarário e divulgada esta semana, a Autarquia reconheceu "a necessidade de salvaguardar produtores e criadores do concelho face à falta de alimento e pasto para os animais".
A saber
Formato presencial
Os certames de divulgação do queijo regressam este ano em formato presencial depois de dois anos de pandemia.
Fora de época
As restrições pandémicas obrigaram a adiar as feiras em março e abril. Queijo à venda por 16 ou 17 euros o quilograma.
Governo apoia
A secretária de Estado da Valorização do Interior, Isabel Ferreira, abre a Feira de Celorico. O cantor Fernando Daniel atua esta noite.