A taxa sobre os lucros excessivos aplicável às grandes empresas dos setores da energia e da distribuição alimentar vai incidir, quase na totalidade, sobre a Galp. No setor alimentar, poucas empresas terão que pagar e, mesmo estas, apenas vão ter valores residuais a liquidar, como a Jerónimo Martins, que estima que só terá de desembolsar 700 mil euros.
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O JN fez as contas aos lucros tributáveis das grandes empresas e concluiu que os valores serão residuais em ambos os setores, com exceção da Galp, cujo negócio da refinaria de Sines faz com que esta empresa seja, de longe, a que mais será chamada a pagar.
Fonte oficial da Galp disse, ao JN, que foi provisionado "um montante de 53 milhões de euros" para esta taxa na Península Ibérica referente às contas de 2022. Tendo em conta o volume de negócio e as características da taxa em cada país, a Galp deverá pagar mais em Espanha do que em Portugal, pelo que nunca será chamada a saldar um valor acima de 25 milhões de euros ao Fisco português. Esta taxa foi criada no final do ano passado para tributar os lucros inesperados de 2022 e de 2023 que as empresas pudessem ter, "injustificadamente, por via desta crise da inflação", explicou, à data do anúncio, o primeiro-ministro António Costa. O dia 20 de setembro é o prazo limite para o pagamento, mas antes é preciso que as empresas preencham um documento, que constará de uma portaria do Governo que ainda não foi publicada. O JN questionou o Ministério das Finanças, mas não obteve resposta.
A forma como a taxa foi criada - os primeiros 20% de lucros "excessivos" não são abrangidos e as pequenas empresas estão excluídas - deixa de fora quase todas as empresas nacionais.
Alimentar: poucos pagam
Segundo Mariana Gouveia de Oliveira, especialista em direito fiscal e sócia da Abreu Advogados, "o grande pagador será a Galp" no setor da energia. Já no alimentar, a exclusão das pequenas empresas "reduz muitíssimo" o universo de potenciais contribuintes e "mesmo os gigantes da distribuição alimentar poderão não ficar sujeitos", prevê a jurista.
Ao JN, o grupo Jerónimo Martins confirma o cenário: "Estimamos que o valor apurado, no caso das nossas empresas de retalho em Portugal, seja inferior a 700 mil euros". Isto, porque "não existem lucros excessivos no Pingo Doce", onde cada euro vendido representa "menos de um cêntimo de lucro" , acrescenta.
O Grupo Sonae MC, dono do Continente, não quis falar sobre o tema, mas as contas do JN indicam que deverá ter de pagar uma taxa ligeiramente superior à do Pingo Doce. Mais abaixo ficará a Ibersol, dona da Pizza Hut e da KFC, que até poderá nem pagar. Confirma-se a previsão da Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição que disse, quando a taxa foi criada, que o aumento das margens de lucro "não existe".
No setor energético, empresas como a EDP, a Repsol ou a Endesa também não deverão pagar. A maioria dos lucros advém das operações no estrangeiro e os lucros tributáveis em Portugal não foram mais de 20% superiores à média dos quatro anos anteriores.
A expectativa de receita, anunciada pelo secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Nuno Félix, em novembro, era de que a taxa daria proveitos entre "50 a 100 milhões de euros" ao Estado. Estas contas tinham, como ressalvou, "uma margem de erro significativa". Tendo em conta os resultados das empresas, ficará aquém.
CEO da Galp exige menos tributação
O presidente executivo (CEO) da Galp, Filipe Silva, defende que é necessário "clarificar com as autoridades as questões fiscais" que vigoram em Portugal, antes de tomar decisões finais de investimento em projetos como o de Sines. Em reunião com analistas financeiros, o CEO declarou, anteontem, que "a Galp tem sido taxada em 64% em Portugal", por isso exigiu "outras condições": "Com este nível de impostos, os projetos simplesmente não avançam".
Dois milhões de euros que Espanha cobrará
As contas do jornal "El País" indicam que a taxa em Espanha deverá custar cerca de 2 mil milhões de euros às empresas de energia. A Repsol, a Iberdrola e a EDP estão entre as que deverão pagar.
0,09 por cento é o peso da taxa no total da receita do Estado
Os 50 milhões de euros que o Governo esperava arrecadar com a taxa sobre lucros excessivos representam 0,09% da receita total do Estado com impostos de 2022. Será, porém, inferior.
Pormenores
O que é a taxa sobre lucros excessivos?
A contribuição de solidariedade temporária, mais conhecida como taxa sobre lucros excessivos, foi criada no final de 2022 para o setor da energia, por ordem de Bruxelas, e para o setor alimentar, por opção do Governo. Aplica-se a lucros de 2022 e de 2023.
Que empresas estão abrangidas?
Estão abrangidas médias e grandes empresas que têm como principal atividade o negócio de energias poluentes ou da distribuição alimentar.
Que percentagem do lucro é tributado?
O valor da taxa é regulado pela Lei n.º 24-B de 2022. A taxa é de 33% e incide sobre todo o lucro excessivo.
Qual é o conceito de lucros excessivos na lei?
É o lucro tributável que está 20% acima da média dos quatro anos anteriores. Por exemplo, se uma empresa teve, entre 2018 e 2021, um milhão de euros de lucro anual médio e, se em 2022 teve um milhão e meio, a taxa incide sobre 300 mil euros. Isto, porque os primeiros 20% de lucro adicional (200 mil euros, neste caso) não contam. Assim, o valor a pagar seria de 99 mil euros, que são 33% de 300 mil.