É uma medida do envelhecimento do país: em 23% dos concelhos do continente, vivem mais reformados por velhice do que trabalhadores. Há anos que a baixa natalidade e a maior esperança de vida ameaçam tornar Portugal um país de velhos mas, em um de cada quatro concelhos, essa já é a realidade.
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Sem surpresa, estão sobretudo em Trás-os-Montes, Beira Interior e no Alentejo. Note-se que os dados respeitam só a trabalhadores e reformados do setor privado, pelo que a balança pesa a desfavor dos municípios menores, onde as câmaras são fortes empregadoras.
Neste mapa do envelhecimento, repete-se o cenário de um país com duas realidades. No litoral, cidades e zonas industrializadas, o número de trabalhadores no ativo, com descontos para a Segurança Social, ultrapassa (nalguns casos largamente) o número de quem recebe pensão de reforma por velhice. Dados enviados ao JN pelo Instituto de Segurança Social mostram que, com três trabalhadores por cada reformado, Albufeira lidera a lista, seguida por dois concelhos industrializados do Norte: Lousada e Paços de Ferreira
No Alentejo, Ribatejo e parte das Beiras, há mais trabalhadores do que reformados, mas numa proporção mais equilibrada. Em alguns casos, os números são quase equivalentes. Resende, por exemplo, tem quase tantos trabalhadores quanto reformados.
Mas na raia, bem como no interior do Centro e no Alto Alentejo, o mapa carrega no tom de vermelho. Vinhais consegue, até, ter quase dois reformados por cada trabalhador.
"Como ter dinâmica?"
O encargo com as reformas é nacional mas, realça Ana Alexandre Fernandes, presidente da Associação Portuguesa de Demografia, o desequilíbrio entre a população produtiva e a não produtiva coloca um ónus sobre os municípios: "Como podem ter dinâmica económica e social?". De facto, todos os concelhos com mais reformados do que trabalhadores estão na lista dos municípios de baixa densidade, que a política pública discrimina positivamente.
A preponderância dos beneficiários da Segurança Social, face aos contribuintes, abre à discussão a sustentabilidade das pensões. Ainda em abril, um estudo da Fundação Francisco Manuel dos Santos perspetivava o impacto da subida da idade da reforma, dos descontos ou corte no valor das pensões. E abria a porta a fontes alternativas de financiamento.
Seja qual for a solução, diz Ana Alexandre Fernandes, "não podemos converter população em idade ativa em reformados".
A promessa da natalidade
A alternativa é captar imigrantes (difícil num país com uma economia frágil) ou subir a natalidade. Sucessivos governos e partidos na oposição têm apresentado roteiros para ajudar as famílias a ter mais filhos, mas sem consequência prática.
"O poder político vai ajeitando o discurso às circunstâncias", lamenta Ana Alexandre Fernandes. Empresas hostis à conciliação da vida familiar com a laboral, salários baixos e falta de creches acessíveis, elenca, contribuem para que as crianças sejam cada vez mais raras.