Reembolsados mais de 5,7 mil milhões de euros em 2021. Altura é boa para amortizar, mas só nalguns casos, dizem especialistas.
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Os portugueses amortizaram, em 2021, mais de 5,7 mil milhões de euros de créditos à habitação, o que representa um crescimento de 30% face a 2020 e de 19% face a 2019. A corrida às amortizações deve-se à subida das taxas de juro, que já se previa, e à existência de poupanças que não se gastaram na pandemia de covid-19.
Em 2021, houve 132 375 reembolsos de créditos à habitação, num total de 5,7 mil milhões de euros, de acordo com o Banco de Portugal. A maioria, 5,3 mil milhões, é referente a reembolsos totais, em que o crédito ficou liquidado (cerca de 89 mil contratos). Os outros 400 milhões são reembolsos parciais (quase 43 mil contratos). Em média, quem optou pelo reembolso total entregou 59 791 euros ao banco, enquanto que o reembolso parcial foi, em média, de 9684 euros. Os créditos mais baixos, até 25 mil euros, representam quase um terço do total de empréstimos liquidados, ao passo que mais de metade de quem optou pelo reembolso parcial não entregou mais do que 2500 euros ao banco onde contraiu o crédito.
Como explica Nuno Rico, economista da Deco Proteste, a corrida às amortizações resulta de alguma liquidez gerada pelas famílias na pandemia, aliada à previsível subida das taxas de juro (ler entrevista). Se, em 2021, a Euribor a seis meses ainda estava em valores negativos, já se antevia que a política de juro baixo tinha os dias contados. As suspeitas confirmaram-se e, em junho deste ano, a Euribor a seis meses, que é a mais utilizada em Portugal, chegou a terreno positivo. Hoje está acima dos 2%.
Casos em que vale a pena
Houve, no entanto, quem não conseguisse poupar na pandemia e quisesse precaver a subida da Euribor. Estes optaram por renegociar o crédito, o que resultou numa corrida às renegociações que se traduziu em 35 203 créditos alterados. É um aumento de 36% face a 2020 e de 17% face a 2019.
O Banco de Portugal identifica mais razões para o aumento das renegociações: "Pode estar relacionado com o baixo número de renegociações, verificado em 2020, devido à vigência do regime de moratória pública e com a antecipação da cessação deste regime, que ocorreu em setembro de 2021".
A OCDE - Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico estima que as taxas de juro subam para valores acima dos 4% no próximo ano, o que terá um forte impacto na prestação da casa. O Governo já prometeu suspender, em 2023, a taxa de 0,5% que se paga pela amortização antecipada dos créditos com taxa variável. Neste cenário, compensa ou não amortizar o crédito? Os especialistas dizem que sim, mas com ressalvas. "Para uma pessoa que tenha depósitos no banco pode ser uma boa opção, não pondo em causa a almofada financeira para imprevistos", diz Andreia Teixeira, consultora financeira.
Há, contudo, dois pressupostos a ter em conta. O primeiro, avisa, é o de "nunca interromper um período de capitalização" para obter liquidez para amortizar. O segundo é estar atento ao momento do contrato. Num crédito recente, a proporção de juros na prestação é alta. Portanto, a mensalidade é mais influenciada por subidas da Euribor e por amortizações. Nestes casos compensa. No caso de créditos antigos, segundo Andreia Teixeira, já não: "Para quem está com os contratos a cinco anos ou até a dez anos de acabar, que já está a amortizar há 20, 25 ou 30 anos, o impacto é muito menor e aí mais vale guardar o dinheiro".
Ricardo Sousa, professor da Escola de Economia e Gestão da Universidade do Minho, concorda: "Este incentivo será tanto maior quanto maior for o capital médio em dívida. Seja porque a prestação média é elevada e irá aumentar ou porque o crédito é relativamente recente e a maturidade do mesmo é longa".