“Arroz-doce, o livro” é a nova obra de três autoras que reúne receitas e se debruça sobre as raízes desta sobremesa pelo mundo, as variações regionais por cá e a sua referência em obras literárias. Falamos de um doce com forte “ligação emocional”
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Está bem enraizado no nosso receituário e nas nossas preferências quotidianas, mas as fronteiras geográficas do arroz-doce não se limitam a Portugal. Muito pelo contrário. A começar pela influência árabe, que trouxe o cultivo do arroz até nós, e pelas primeiras referências bibliográficas a este doce, em Bagdade, que remetem à época medieval. Em “Arroz-doce, o livro – Histórias, estórias e recolhas”, as autoras Dora Caetano, Ana Silvestre e Susana Jorge - membros da Confraria do Arroz-Doce: Gastronomia, Cultura e Investigação – abordam as raízes desta sobremesa no mundo e a origem e evolução dos seus principais ingredientes: além do arroz, a canela, o açúcar, o leite, os ovos e o limão.
As receitas espalhadas pelo livro são várias, tanto antigas como recentes, e incluem figuras como Maria de Lourdes Modesto, Joana Barrios e Maria Odette Cortes Valente. Além disso, é abordada a versatilidade deste doce, nas suas várias encarnações regionais de norte a sul do país, e também nas ilhas. Os oito volumes de “Cozinhas de Portugal”, de Maria Odette Cortes Valente, explica que, por exemplo, o arroz-doce de Ponte de Lima é mais cremoso, e o de Secoril mais firme, podendo ser cortado à faca. Ou que em Moita dos Ferreiros é enriquecido com manteiga e no Baixo Alentejo com banha de porco. Ou até que na ilha do Faial, se serve com massa sovada nas Festas do Espírito Santo.
Um trabalho de pesquisa e recolha “longo” mas “gratificante”, explica Dora Cateano, que implicou leitura de várias obras e testemunhos de pessoas de várias regiões. “O livro nasceu do fascínio por algo que é genuinamente nosso. Sempre associei o arroz-doce às celebrações em família, às mesas cheias. Foi bom perceber que muita gente tem essa ligação emocional”, conta a presidente da confraria, criada em 2019.
Sobre a popularidade do arroz-doce, que atravessa gerações, reconhece: “Os ingredientes são simples. É um doce ligado às festividades, à família, à partilha, ao conforto. Traz-nos memórias e transporta-nos para um tempo feliz. Toda a gente tem uma avó, uma tia, uma mãe, uma bisavó que fazia ou faz o melhor arroz-doce de todos. Ainda hoje ouvimos isso nas feiras em que participamos”. E mesmo na correria dos dias, isso não vai mudar. “O arroz-doce não é uma receita antiga, nem futura, é atual”, sublinha Dora Caetano. “Fazer um tacho de arroz-doce é investir tempo. E esse investimento é uma transmissão de carinho para quem vai desfrutar deste doce.”
De referir ainda que “Arroz-doce, o livro” reúne uma série de referências a esta popular sobremesa na literatura aquém e além-fronteiras. Camilo Castelo Branco em “Noites de Lamego” e “A brasileira de Prazins”; Eça de Queirós em “O crime do padre Amaro”, “Os Maias” e “As cidades e as serras”; Fernando Pessoa em “Quadras ao gosto popular”; Miguel Torga em “Contos da montanha”; António Gedeão em “Dor de alma”; Alice Vieira em “Corre, corre cabacinha”; Miguel Sousa Tavares em “Rio das Flores”; e Jorge Amado em “Dona Flor e os seus dois maridos” são alguns dos exemplos transcritos.
Arroz-Doce, o Livro – Histórias, estórias e Recolhas
De Dora Caetano, Ana Silvestre e Susana Jorge
Editora d’Ideias
180 páginas
Preço: 28 euros