Investigadores europeus estão a levar as tecnologias conhecidas como "dispositivos usáveis inteligentes" para o nível seguinte, com sistemas mais pequenas, confortáveis e que o podem ajudar a monitorizar o estado físico e a cuidar da saúde.
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O que têm em comum andar de bicicleta, tomar banho e fazer amor?
As três atividades provam a utilidade de uma nova geração de adesivos cutâneos que podem monitorizar os sinais vitais das pessoas, como a tensão arterial e o ritmo cardíaco, segundo Klas Hjort, diretor do programa de tecnologia de microssistemas da Universidade de Uppsala, na Suécia.
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Embora os "dispositivos usáveis inteligentes" já estejam presentes no mercado e na vida das pessoas, os investigadores estão a tentar melhorar as tecnologias em áreas como a saúde online e tornar os dispositivos mais confortáveis de usar durante as atividades do dia a dia. Hjort liderou um projeto de investigação denominado SINTEC, que recebeu financiamento da UE para desenvolver adesivos cutâneos macios, impermeáveis e reutilizáveis, implantados com sensores e concebidos para levar as tecnologias de dispositivos usáveis inteligentes para o nível seguinte.
O projeto, que teve uma duração de quatro anos e meio, terminou em junho de 2023 e envolveu universidades, um organismo de investigação e empresas de Itália, Países Baixos, Espanha e Suécia.
"Apercebemo-nos da necessidade de ter adesivos inteligentes mais confortáveis, que qualquer pessoa possa utilizar independentemente do que esteja a fazerem espaços abertos ou fechados - fazer um passeio à chuva, caminhar, nadar, tomar um duche, andar de bicicleta ou mesmo ter relações sexuais", afirmou Hjort.
Os dispositivos usáveis inteligentes fazem parte da Internet das Coisas, IoT na sigla em inglês, uma vasta rede de objetos físicos com tecnologias incorporadas, como sensores e software, que permitem ligar e trocar dados com outros dispositivos através da Internet.
Um dos principais desafios dos dispositivos usáveis inteligentes é desenvolver sensores que sejam suficientemente confortáveis para serem utilizados ao longo do dia e que não interfiram com as atividades de rotina.
Debaixo da pele
O dispositivo SINTEC inclui um sensor macio reutilizável que se assemelha a uma pequena chave USB e é mantido no lugar por um adesivo não reutilizável. Para além de ser macio e impermeável, o adesivo é extensível.
Monitoriza a tensão arterial e a atividade elétrica do coração, permitindo que condições como lesões orgânicas, doenças cardiovasculares, a morbilidade e mortalidade relacionadas com acidentes vasculares cerebrais sejam acompanhadas de perto pelos prestadores de cuidados.
O dispositivo poderá também proporcionar uma nova forma, não intrusiva, de gerir a hipertensão, uma doença "silenciosa" que se caracteriza por uma tensão arterial elevada e que pode provocar acidentes vasculares cerebrais, doenças renais e insuficiência cardíaca.
No desporto, o sensor SINTEC é mais confortável para os desportistas do que as tecnologias existentes, uma vez que é mais leve e mais fino: sete gramas e três milímetros para o sensor em comparação, por exemplo, com os 53 gramas e 13 mm de um smartwatch típico.
Benefícios para a saúde e a forma física
O sector dos cuidados de saúde é potencialmente o maior beneficiário.
Os dispositivos usáveis inteligentes podem, por exemplo, permitir a prestação de cuidados médicos à distância aos doentes, alertar os adultos para o declínio gradual da saúde e ajudar as pessoas a recuperar mais rapidamente de lesões ou doenças.
O fitness desportivo é outro domínio em que os dispositivos usáveis inteligentes podem desempenhar um papel importante. Podem medir parâmetros fisiológicos, como a frequência respiratória e a oxigenação do sangue, que anteriormente só podiam ser testados em laboratório.
"Estes adesivos inteligentes podem ajudar os atletas que treinam intensamente a otimizar o seu treino e a reduzir o risco de lesões", afirmou Hjort.
É neste contexto que se refere à sua utilidade potencial durante o ato sexual.
"São robustos e podem ser utilizadas por qualquer pessoa, em qualquer lugar e em qualquer altura", afirmou Hjort. "A utilidade de tais adesivos inteligentes discretos não é específica para o ato sexual, mas não será prejudicada por ele nem o prejudicará".
Mercado em crescimento
Empresas privadas, incluindo a STMicroelectronics em Itália, a EVALAN, especialista em IoT, nos Países Baixos e a Mycronic, fabricante de equipamento de alta precisão para a indústria eletrónica com sede na Suécia, colaboraram com os investigadores para fazer avançar esta tecnologia.
Prevê-se que os adesivos representem uma parte significativa do mercado mundial de dispositivos usáveis inteligentes. De acordo com uma análise, o valor do mercado dos adesivos inteligentes ultrapassará os 25 mil milhões de euros até 2033.
Na Europa, os principais produtores de adesivos inteligentes incluem duas empresas suecas, a Beneli e a Nile, bem como a Quad Industries, na Bélgica.
"A minha esperança é que as empresas europeias possam assegurar pelo menos 10% deste mercado com a nossa tecnologia, dado que os principais fabricantes de adesivos inteligentes estão atualmente sediados na Europa", afirmou Hjort.
Poder de doutoramento
Outra prioridade na área em rápido desenvolvimento dos dispositivos portáteis é avaliar onde serão mais úteis para a sociedade nas próximas décadas. Foi isso que um outro projeto financiado pela UE abordou. Denominado A-WEAR, teve também uma duração de quatro anos e meio, e terminou em junho de 2023.
O projeto preparou 15 jovens investigadores para enfrentar os desafios futuros no domínio da tecnologia de vestuário inteligente e da computação sem fios.
Os investigadores formaram uma rede europeia de doutoramento entre cinco instituições académicas: Universidade de Tecnologia de Brno, na República Checa, Universidade Jaume I, em Espanha, Universidade Mediterrânica de Reggio Calabria, em Itália, Universidade Politécnica de Bucareste, na Roménia, e Universidade de Tampere, na Finlândia.
Cada um dos 15 estudantes obteve um doutoramento duplo ou conjunto em duas das cinco universidades. Onze doutoraram-se e os restantes quatro deverão terminar a sua formação em meados de 2024.
A sua investigação centrou-se nas aplicações sociais e industriais de dispositivos portáteis inteligentes em áreas como a saúde em linha, as redes sociais e a robótica industrial.
Por exemplo, um estudante centrou-se na utilização de dispositivos usáveis inteligentes para identificar precocemente doenças como a doença de Parkinson ou perturbações neurocognitivas, mesmo antes da deteção através de testes tradicionais.
Os sensores inteligentes podem detetar até pequenas alterações nos padrões de movimento de uma pessoa, como a paragem ocasional da marcha. Estas alterações estão associadas a um risco acrescido de doenças como a doença de Parkinson, segundo Simona Lohan, professora da unidade de engenharia elétrica da Universidade de Tampere, que dirigiu o A-WEAR.
"A utilização de vestíveis inteligentes para a saúde em linha beneficiará muito a sociedade no seu conjunto, permitindo cuidados precoces e melhorando a prevenção", afirmou.
Funcionalidades de localização
Outros estudantes de doutoramento concentraram-se em melhorar as funcionalidades de localização dos dispositivos usáveis inteligentes.
Atualmente, a localização em espaços fechados é dificultada pelo facto de os edifícios e as estruturas interiores poderem interferir com os sinais utilizados.
"A localização em espaços fechados continua a ser um grande desafio", afirmou Lohan. "Os alunos exploraram vários métodos, como a banda ultralarga para uma localização muito precisa, ao nível dos centímetros, e o Bluetooth para uma localização simples mas eficaz".
A Comissária referiu que, embora o A-WEAR tenha terminado, algumas das suas parcerias de diploma duplo entre universidades continuam.
"A sociedade precisa de continuar a investigação no domínio das comunicações sem fios e do posicionamento", afirmou Lohan.
A investigação neste artigo foi financiada pelo Programa Horizon da UE, incluindo, no caso do A-WEAR, através do programa Marie Skłodowska-Curie Actions (MSCA). Os pontos de vista dos entrevistados não refletem necessariamente os da Comissão Europeia.
Este artigo foi originalmente publicado na Horizon, a Revista de Investigação e Inovação da UE.