Ex-presidente do Instituto Nacional de Medicina Legal diz que autópsia descarta mais agressões e que pancada fatal na cabeça também pode ter sido acidental.
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O ex-diretor do Instituto Nacional de Medicina Legal, hoje consultor forense, Duarte Nuno Vieira, disse ontem no julgamento do caso da morte de Luís Giovani que existem "enormes contradições" entre a versão dos factos relatados na acusação e o que revela a autopsia, o que não dá certezas sobre a causa da morte do estudante cabo-verdiano, na sequência de uma rixa que acabou em confrontos numa rua de Bragança. O especialista afasta ainda a existência de outras lesões, como sustenta o Ministério Público (MP), além do traumatismo na cabeça que lhe foi fatal e mesmo este admite que possa ter sido acidental.
"A autópsia evidencia enormes contradições entre o relato do despacho de acusação, aquilo que as testemunhas terão contado, aquilo que o cadáver veio a contar-nos e aquilo que veio a evidenciar contradições significativas que nos não permitem ter a certeza do que terá acontecido", afirmou o professor catedrático, que testemunhou a pedido da defesa de um dos sete arguidos acusados do homicídio qualificado do jovem na noite de 21 de dezembro de 2019.
Ainda assim, Duarte Nuno Vieira ressalvou que não se sabe se "as lesões são resultado de um ato de agressão ou de um impacto acidental da cabeça, perante, também relatos, que indicam a possibilidade de esse impacto ter acontecido", acrescentou.
sem lesões de defesa
A acusação deduziu que o traumatismo na cabeça que terá matado Giovani estava uma alegada agressão com um pau, mas a defesa sempre duvidou, argumentando que resultou de uma queda numas escadas, naquela noite, quando o jovem fugia na sequência de uma rixa que envolvia várias pessoas iniciada junto da escadaria.
Duarte Nuno Vieira diz que "é preciso falar nas várias possibilidades" e que vê com muitas dificuldades que, " com uma lesão provocada por um traumatismo intenso, o cidadão tivesse ainda possibilidade de fazer todo o percurso [mais de 500 metros até ao local onde foi encontrado inconsciente] correndo. Com a gravidade das lesões, não é uma impossibilidade, mas vejo isso com dificuldade", sustentou o perito que descarta outras agressões a murro, pontapé ou soqueira como descreve despacho de acusação.
"A autópsia revela que isso não aconteceu. Há uma pancada única, mas se foi agressão ou acidental eu já não posso adivinhar", descreveu, acrescentando que o corpo do estudante "não tinha sinais de lesões de defesa, nem ativa nem passiva, ou seja defesa de alguém ou de uma queda. Não há certezas. É uma dúvida que vai permanecer", considera o perito.
Já em março, o médico responsável pelo relatório da autópsia, Rui Terras Alexandre, tinha indicado em tribunal que a morte tinha sido causada por uma lesão cranioencefálica - que pode ter sido causada pelas agressões ou por uma pancada contra um objeto estático - e que o corpo de Giovani não apresentava outros ferimentos visíveis à data do exame. Desde o início do julgamento que a causa da pancada fatal estava em aberto, uma vez que o relatório da autopsia foi inconclusivo.
Pormenores
Rixa de madrugada
Luís Giovani morreu a 31 de dezembro de 2019 depois de ter estado dez dias em coma no Hospital de Santo António, no Porto. O jovem esteve envolvido numa rixa na madrugada de 21 de dezembro numa rua em Bragança, acompanhado de amigos. Foi encontrado inconsciente a mais de 500 metros do local da escaramuça.
Sete arguidos
Sete homens, com idades entre 22 e 35 anos sentam-se no banco dos réus acusados de um crime de homicídio qualificado e outro de ofensas à integridade física qualificadas no que se refere a outros três cabo-verdianos do grupo.
Discurso direto
Duarte Nuno Vieira - Consultor forense
"Há uma pancada única, mas se foi agressão ou acidental eu já não posso adivinhar"