O Ministério Público dos Açores acusou 22 pessoas e duas empresas de lesarem o Estado em mais de 9,5 milhões de euros através do subsídio social de mobilidade em apenas dez meses. Venderam bilhetes a preços inferiores ao mercado e depois emitiram milhares de faturas com valores superiores para ficarem com os apoios.
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O esquema terá começado em junho de 2023 e durou até março de 2024. Os arguidos, 13 homens e nove mulheres, organizados em dois grupos distintos, criaram duas empresas com sede na Ilha Terceira, nos Açores. As duas agências de viagens tinham como único propósito vender bilhetes de viagens aéreas entre as regiões autónomas e o continente, elegíveis para o pagamento de subsídio social de mobilidade (SSM).
Refira-se que este apoio, destinado a residentes das regiões autónomas ou equiparados, estabelece preços máximos da viagem (incluindo apenas serviços obrigatórios) entre Açores e continente (134 euros) e entre Madeira e continente (86 euros). Caso o passageiro venha a pagar mais pela viagem, o Estado reembolsa-lhe o valor extra até um máximo de 600 euros para os Açores ou 400 euros para a Madeira.
Segundo a acusação, citada pela Lusa, os arguidos vendiam as passagens aos clientes "por regra a 25 euros", valores muito inferiores aos preços de mercado. Porém, depois, criavam faturas-recibo fictícias, com os valores inflacionados e em nome de um dos arguidos, para assim poder obter reembolsos avultados de SMM.
Falsificaram mais de 3500 faturas para receber 9,5 milhões
Ao venderem os bilhetes a preços muito baixos, conseguiam aumentar o número de clientes e, ao mesmo tempo, aumentar o número de bilhetes em relação aos quais conseguiam pedir os reembolsos. Deste modo, aponta a acusação, terão falsificado mais de 3500 faturas de viagens tendo recebido indevidamente mais de 9,5 milhões de euros.
“Conforme resulta dos factos descritos na acusação, com a prática dos crimes por que foram acusados, mediante o uso de documentação falsa, os arguidos obtiveram as quantias também indicadas, a título de SSM, quantias essas que, na realidade, não lhe eram devidas, e que só lhes foram pagas face à situação de erro a que os arguidos induziram a entidade pagadora (CTT)”, defende o MP.
Entre junho de 2023 e março de 2024, a empresa Dias Estridentes criou 2417 faturas fraudulentas, que deverá ter lesado o Estado em mais de 7,2 milhões de euros. Já a firma Iven Cunha/Fly Dreams deverá ter criado “pelo menos” 1149 faturas fictícias, o que resultou na obtenção de 2,3 milhões de euros indevidos.
Mais de metade do dinheiro por recuperar
Alguns dos arguidos movimentaram os valores obtidos de forma a dissimular a sua real origem, "dando a aparência que lhes chegaram de forma legítima e, para o mesmo efeito, colocaram em nome de terceiros alguns dos bens adquiridos com aqueles valores", afirma o MP. Do valor total em que se estima que o Estado tenha sido lesado (9,5 milhões), não foi possível recuperar 6,22 milhões de euros, apesar da apreensão de várias quantias e bens (como um barco e 10 veículos de alta cilindrada e topo de gama).
Os arguidos foram acusados no passado dia 20 de março dos crimes de associação criminosa, especulação, falsificação de documentos, burla qualificada e branqueamento. Num primeiro momento, a investigação esteve a cargo da Secção da Praia da Vitória do DIAP dos Açores, tendo transitado para a Secção de Ponta Delgada do mesmo DIAP. No âmbito da operação, batizada de "Mayday", foram realizadas 26 buscas, das quais resultou a detenção de nove pessoas em março de 2024. O Ministério Público foi coadjuvado pelo Departamento de Investigação Criminal dos Açores da Polícia Judiciária.