O julgamento de um dos três processos em que o ex-banqueiro João Rendeiro acabou condenado a pena de prisão começou dois anos depois do suposto, devido ao afastamento, sem razão, de uma juíza que iria integrar o coletivo de três magistrados.
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A conclusão consta do relatório, divulgado parcialmente ontem, elaborado pelo inspetor que dirigiu o procedimento aberto pelo Conselho Superior da Magistratura (CSM) para apurar se algum juiz incorre em responsabilidade disciplinar pela fuga à Justiça do antigo líder do BPP. Raul Borges considera que não. Aponta, contudo, diversas falhas no caso, incluindo a falta de comunicação entre os tribunais das várias instâncias.
João Rendeiro, de 69 anos e condenado a um total de mais de 19 de cadeia, fugiu em setembro do país e foi entretanto capturado na África do Sul, onde aguarda, preso, uma decisão sobre a sua extradição para Portugal.
"Não se descortinando indício de responsabilidade disciplinar, há que dizer que nem tudo terá corrido da melhor forma, se bem que sem ação direta dos juízes", refere, nas conclusões publicadas pelo CSM, o inspetor judicial. Desde logo, salienta, a emissão de uma ordem de serviço que, ao alargar os impedimentos dos juízes, se traduziu, associada à dificuldade da formação de um novo coletivo, no adiamento de janeiro de 2018 para março de 2020 do início do segundo dos três julgamentos .
Em causa, apurou o JN, está um pedido de escusa feito por uma magistrada, alegando que era casada com um juiz que interviera anteriormente no mesmo processo, relacionado com o desfalque do BPP. O afastamento foi aceite e o caso teve de ser redistribuído.
"Cremos ser de evitar intromissão administrativa na determinação da composição do coletivo quando as soluções para os casos de impedimento se encontram estipuladas no Código de Processo Penal", defende o inspetor.
não foi pedida prisão
Para Raul Borges, o processo em que poderia ter-se colocado a questão da alteração da medida de coação foi, porém, o primeiro, no qual João Rendeiro foi condenado por falsear as contas do banco, dissolvido em 2010. Só que, por um lado, "nada foi promovido" nesse sentido, e por outro, durante dois anos, quatro meses e 22 dias, o juiz titular do caso na primeira instância nada soube sobre o estado deste nos tribunais de recurso.
"Há que tomar devida nota de que, no caso de subida de processo a tribunal (is) superior(es), deverá ser estabelecida relação comunicacional", alerta o inspetor.