Autarca acusado de receber bilhetes para futebol e obras em casa para favorecer empresa
O presidente da Junta de Freguesia de Fátima, um empresário e uma pedreira foram acusados de recebimento e oferta indevida de vantagem e abuso de poder. Em causa está a cedência de um terreno da autarquia para o depósito ilegal de inertes resultantes da atividade de uma empresa
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Segundo a investigação da PJ de Leiria, em dezembro de 2019 Humberto Silva terá recebido de uma pedreira, por duas ocasiões, bilhetes para jogos de futebol e futsal, com refeições e comodidades incluídas. Nesse mesmo ano, o Executivo por ele presidido assinou um protocolo em que cedia um terreno da freguesia para que a empresa ali depositasse “tou-venant” e intertes resultantes da sua operação.
Porém o terreno estava em zona de Reserva Ecológica Nacional (REN) logo não reunia as condições legais para se tornar num depósito. A acusação aponta que a cedência “violou legislação ambiental uma vez que o referido terreno se situava numa zona REN, não existindo qualquer autorização legal para o efeito”.
A GNR detetou a ilegalidade e levantou diversos autos de contraordenação muito grave contra a freguesia de Fátima. O presidente foi informado, mas “nunca fez cessar aquele protocolo e possibilitou que tal situação se mantivesse até à atualidade, prejudicando o interesse público”, refere o MP.
Além disso, entre dezembro de 2020 e o primeiro semestre de 2021, aproveitando-se da sua qualidade de presidente de junta de freguesia, solicitou ao empresário que a sua empresa suportasse o pagamento de obras de remodelação na parte superior da sua moradia de família. O empresário comprometeu-se com a realização da empreitada, orçada em 93 mil euros, mais IVA, tendo inclusive encomendado e pago, através de uma conta da empresa, um projeto de arquitetura para esse efeito.
“Resulta da acusação que o arguido empresário pretendeu com esta conduta condicionar a atividade política do primeiro arguido, favorecendo os interesses da sociedade arguida.Concomitantemente, o primeiro arguido, enquanto titular de cargo politico, quis aceitar e solicitar as referidas oferendas, mostrando disponibilidade para satisfazer os interesses privados da respetiva sociedade”, lê-se num comunicado do Departamento de Investigação e Ação Penal de Évora.
Face à acusação, Humberto Silva incorre em perda de mandado de membro de órgão representativo de autarquia local e, ainda, nas penas acessórias de proibição e suspensão de exercício de funções públicas. O MP pede ainda que as vantagens indevidas, alegadamente recebidas, sejam declaradas perdidas a favor do Estado, ficando Humberto Silva condenado ao seu pagamento.
Os arguidos ainda podem pedir a instrução do processo. O JN contactou o Humberto Silva que disse garantiu a sua inocência. "Se não estivesse inocente, tinha-me demitido. Nunca fiz nada no meu interesse. Foi tudo sempre a Junta, nunca para mim", assegurou, frisando que se irá defender e provar que a interpretação do MP é "outra coisa".