Tribunal de recurso contraria sentença de primeira instância e conclui que concessionária da A3 tem de garantir condições de segurança a utilizadores.
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O Tribunal Central Administrativo do Norte decidiu que a Brisa, concessionária da autoestrada n.º 3 (A3), que liga o Porto a Valença, terá de indemnizar em 4222 euros o proprietário de uma viatura que, na madrugada de 17 de abril de 2022, embateu num javali.
O sinistro deu-se ao quilómetro 58, numa curva entre Braga e Ponte de Lima, pouco depois do posto de combustível de Barcelos e antes da saída de Anais, Vila Verde.
A verba referida, a que se somarão juros, é atribuída para pagamento do arranjo do automóvel, que ficou com a frente danificada.
A decisão contraria a que havia sido tomada pelo Tribunal Administrativo de Braga, que indeferiu a pretensão de indemnização, com o argumento de que não se tinha provado que o animal invadiu a faixa de rodagem por culpa da Brisa.
Esta alegara que, após o acidente, vistoriou as vedações existentes nas bermas, numa extensão de 250 metros, e nada de anormal encontrou. Garantiu ainda que faz patrulhas com veículos próprios naquela via à procura de anomalias, nomeadamente de animais.
No julgamento em primeira instância, uma testemunha, funcionário da Brisa, confirmou ter ido ao local, vistoriado as vedações e retirado o javali morto, mas acabou por dizer que, muitas vezes, os animais entram na autoestrada, não através de buracos nas cercas, mas sim através das próprias zonas de portagem. Admitiu também que, no mesmo dia, três horas antes, foram avistados dois cães na via.
Imposição legal
Os juízes do Tribunal Central Administrativo do Norte, sediado no Porto, entenderam que "a imposição legal de assegurar as condições de segurança em lanço rodoviário concessionado integra uma obrigação reforçada de meios". E explicam: "Só o "caso de força maior devidamente verificado" exonera a concessionária da sua obrigação de garantir a circulação nas autoestradas em condições de segurança. Para afastar a presunção de culpa estabelecida na lei, terá a concessionária de provar a ocorrência de um acontecimento concreto que integre o conceito de força maior, ou seja, de um acontecimento imprevisto e irresistível cujos efeitos se produzem independentemente da vontade ou das circunstâncias pessoais da concessionária".
A concluir, os juízes do tribunal de recurso salientam que "a Brisa não conseguiu mostrar a forma como o javali entrou na autoestrada, por forma a imputar a sua proveniência a terceiros ou a caracterizá-la como um caso fortuito". "Não foi ilidida a presunção de incumprimento que sobre si impendia relativamente ao aludido dever de vigilância", acrescentaram.
Cães foram avistados na mesma zona
Os juízes do Tribunal Central Administrativo do Norte relatam no acórdão que, após o acidente, pelas 5.19 horas de 17 de abril de 2022, o operador da central de comunicações da Brisa acionou um painel de mensagem variável com o intuito de avisar os utentes para a existência de acidente na via. E um trabalhador da concessionária deslocou-se ao local. O tribunal também deu como certo que, dias 16 e 17, a Brisa efetuou vários patrulhamentos e não viu nenhum javali. Foi-lhe comunicado, no entanto, o avistamento de dois cães, no mesmo quilómetro do acidente, mas que terão desaparecido no talude.
Lei
Obrigações
"Em via concessionada, o lesado por acidente de viação tem direito a ser indemnizado, incluindo por danos sofridos pelo veículo, verificados que estejam os demais requisitos da responsabilidade civil", sentenciou o Tribunal Central Administrativo do Norte .
Exceções
A Lei n.º 24/2007 elenca exceções que desresponsabilizam as concessionárias. São "casos de força maior", que afetem diretamente as atividades da concessão e não sejam imputáveis ao concessionário: condições climatéricas excecionais (graves inundações, ciclones ou sismos), cataclismos, epidemias, radiações atómicas, fogo ou raio, tumultos, subversão, terrorismo, rebelião ou guerra.