Um café de Gaia apanhado pela Polícia com três clientes no seu interior, um deles a tomar café, num período da pandemia da covid-19 em que vigorava estado de emergência, foi notificado, para se defender, de um processo de contraordenação que lhe pode custar entre mil e dez mil euros. O café contestou a contraordenação, alegando que, quando dela foi notificada, em abril de 2022, já não estava em vigor o decreto-lei que só autorizava os estabelecimentos a atender clientes ao postigo. Assim, deve aplicar-se-lhe o princípio da lei mais favorável, defende.
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No dia 10 de fevereiro de 2021, a PSP do Porto foi ao café/pastelaria e deu com três clientes no interior. A funcionária assumiu, então, que lhes tinha servido café e pão, acrescentando que lhes pedira para sair, ao que eles responderam que o fariam de seguida. "Era só uns minutos". Os polícias então tomaram conta da ocorrência com vista à passagem de uma coima, nos termos do Decreto-lei n.ºº 3-A/2021, de janeiro de 2021, que proibia a permanência de clientes em estabelecimentos de restauração durante o estado de emergência.
Inconstitucional, alega
Na contestação feita junto do Comando Metropolitano do Porto da PSP, a que o JN teve acesso, a empresa proprietária do café/pastelaria, na avenida Ramos Pinto, em Vila Nova de Gaia, sustenta que, quando foi notificada, aquele decreto-lei já tinha sido substituído pelo 28-B/2020, que não impunha as referidas restrições. Assim sendo, defende, a aplicação da contraordenação seria inconstitucional, por violação do princípio da "aplicação da lei penal mais favorável". Segundo este, "ninguém pode sofrer pena ou medida de segurança mais graves do que os previstos no momento da correspondente conduta ou da verificação dos respetivos pressupostos, aplicando-se retroativamente as leis penais de conteúdo mais favorável ao arguido".
"A pendência processual, sem um fim temporariamente fixado pelo legislador, significaria a possibilidade de manter indefinidamente uma incerteza quanto à culpabilidade e responsabilidade do agente, o que não é compatível com um Estado de Direito", argumenta ainda a contestação.
A isto, o café acrescenta que a contraordenação prescreveu, dado que passou mais de um ano, desde a fiscalização da PSP até à notificação, e que é juridicamente nula, visto que a notificação policial não elenca se a "alegada infração foi praticada com dolo ou negligência, o que impede a arguida de poder exercer em plenitude o seu direito de defesa e exercer o contraditório".
A concluir, o café pede que os autos sejam arquivados, alegando que o café não praticou os atos indicados na coima. Até, agora, a PSP ainda não lhe deu reposta.