O desmantelamento do maior laboratório de produção de cocaína da Europa confirmou uma nova tendência no tráfico de droga entre a América do Sul e os países europeus. Os cartéis internacionais estão a exportar cada vez mais - a partir da Colômbia, Bolívia e Peru - pasta de coca em vez da tradicional cocaína em pó pronta a consumir. Este "modelo de negócio" permite minimizar os prejuízos em caso de apreensões, facilita a dissimulação da droga e aumenta a qualidade do estupefaciente produzido em laboratórios mais sofisticados.
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Uma operação conjunta da Polícia Judiciária, da Polícia Nacional espanhola e das autoridades colombianas descobriu e desmantelou, tal como o JN noticiou esta sexta-feira, um laboratório de produção de cocaína, em Pontevedra, Espanha. Montado numa vivenda no meio do bosque, o espaço era bastante sofisticado e tinha capacidade para transformar 200 quilos por dia de pasta de coca em cocaína pronta a consumir. Mais de tonelada e meia deste produto entrou na Europa escondida numa máquina trituradora enviada da Colômbia para o porto de Leixões.
A Polícia Nacional refere que este caso "permite constatar uma nova tendência no tráfico de cocaína, em que a substância estupefaciente é exportada sem ter sido sujeita ao processo químico" que, normalmente, é levado a cabo em laboratórios clandestinos instalados nos países de origem da droga.
As autoridades espanholas explicam ainda que esta alteração no método de tráfico é encarada pelas organizações criminosas como uma "forma de diminuir os prejuízos perante possíveis operações policiais". Ou seja, se a pasta de coca for apreendida, os traficantes poupam no investimento avultado que é necessário para a transformar em cocaína passível de ser consumida.
Produto quase indetetável
Fontes policiais portuguesas, contactadas pelo JN, apresentam outro motivo: a pasta de coca é muito mais fácil de dissimular, sobretudo em máquinas de grande dimensão. No caso agora revelado, a pasta de coca vinha escondida no interior de dois cilindros de metal, com dez centímetros de diâmetro, e passou incólume em várias inspeções da Polícia Judiciária. Estas foram realizadas durante os cerca de três meses em que a trituradora permaneceu no porto de Leixões e no armazém de uma empresa do Grande Porto, comprada por um empresário do País Basco, apenas para justificar a importação da droga.
Somente quando os polícias arrombaram o laboratório clandestino de Pontevedra é que perceberam onde é que a pasta de cocaína estava disfarçada. Tiveram, inclusive, de recorrer a um martelo pneumático para a retirar da trituradora.
Cocaína "europeia" mais pura
Em relatório do ano passado, o Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência já tinha alertado para este novo paradigma justificado, então, pela apreensão de maiores quantidades de pasta de coca em território europeu. O documento salientava, igualmente, a apreensão de quantidades significativas, e nada usuais, de produtos químicos necessários para transformar pasta de coca em cocaína e identificava, em países como Espanha e Países Baixos, laboratórios ilegais onde o processo químico era efetuado.
Segundo os especialistas do Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência, os laboratórios europeus replicavam o modelo colombiano, mas eram muito mais sofisticados devido a avançados sistemas de extração de ar e refrigeração.
Embora "cozida" pelos mesmos "cozinheiros" de nacionalidade colombiana, a cocaína encontrada nos laboratórios europeus apresentava uma pureza mais elevada do que aquela exportada da América do Sul. Químicos de mais qualidade e melhores meios de produção fundamentam a diferença.
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