Quando, em 2017, tentou registar uma preciosa mota da marca Harley-Davidson, modelo KH, de 1954, da qual tinha comprado apenas o quadro, o depósito e duas rodas, Paulo Alho, um colecionador de motos antigas residente em Abrantes, não fazia ideia da carga de trabalhos em que se estava a meter.
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O veículo, que pertenceu à PSP, havia sido retirado do serviço e vendido, mas a baixa do registo da matrícula não foi dada e aquela força de segurança entendeu que ele ainda lhe pertencia. Por isso, avançou com um processo judicial, obrigando Paulo a entregar as peças ao tribunal. Passados mais de dois anos, o colecionador viu finalmente a Justiça dar-lhe razão e já entrou com um requerimento para que lhe sejam devolvidas as peças apreendidas.
"Era tudo evitável. Bastava que tivessem ouvido o meu advogado, ou pedido que eu explicasse onde e a quem tinha comprado o material e tinham-me evitado chatices e despesas desnecessárias", desabafou Paulo Alho ao JN, após a sentença a seu favor ter transitado em julgado, sem que Direção Nacional (DN) da PSP tivesse recorrido.
Inspirado pelos filmes da II Guerra Mundial, a que assistiu quando era jovem, no cinema de Alferrarede, Paulo foi alimentando a paixão por motos antigas. Em 1993, começou a colecionar este tipo de veículos, comprando-os degradados ou às peças, para depois os restaurar. Foi assim, que em 1999, conseguiu comprar, integrada num lote de vário material, parte de uma Harley-Davidson que tinha integrado a frota da PSP entre 1955 e 1973 e que havia sido entregue à Direção-Geral da Fazenda Pública para ser abatida e desmantelada.
O problema é que, como ficou provado em tribunal, os serviços não deram baixa da matrícula e quando, há dois anos, Paulo tentou registar a moto em seu nome, por usucapião, a Direção Nacional da PSP levantou-lhe um processo, acusando-o de litigância de má-fé. E, além de reclamar a propriedade do que restava do veículo, ainda lhe pedia uma indemnização.
Só que, depois de ter reconstituído o percurso e historial da moto, a juíza deu razão ao colecionador, declarando-o legítimo dono e ordenando a devolução das peças confiscadas. Paulo pode agora respirar de alívio e voltar ao restauro da sua Harley, acrescentando, assim, mais uma moto antiga à sua coleção e reforçando o lote de veículos que leva às concentrações de clássicos.
Pormenores
15 mil escudos (75 euros) era o valor da Harley-Davidson da polémica, modelo KH1954, com algumas peças em falta, segundo uma avaliação efetuada em 1981. O valor foi confirmado durante o processo.
Paixão pelas duas rodas - Paulo Alho é funcionário público e nas horas vagas dedica-se ao restauro de motas antigas. Tem neste momento uma dezena, oito das quais a funcionar. A mais velha data de 1927.
Confusão nos registos - Um técnico da PSP ouvido em tribunal testemunhou que o facto de o veículo ainda estar registado em nome daquela força de segurança ter-se-á devido à eventual "confusão nas instituições públicas", no pós-25 de Abril de 1974.