No dia 8 de novembro de 1963, e começando a história pelo fim, titulava o JN que "Foi o Rogério Sapateiro quem matou a viúva da Rua do Sol". Para trás ficavam 17 dias de reportagens sobre a viúva Margarida Cepeda da Silva, uma abastada comerciante de solas, cabedais e artigos afins, que residia na Rua do Sol, no Porto, e "fora encontrada morta, no porão da sua residência, com evidentes indícios de ter sido assassinada".
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O então jovem repórter Germano Silva, que acompanhou o caso desde que o corpo foi encontrado, no dia 22 de outubro, e descobriu o criminoso, escrevia, no estilo próprio da época, que a "movimentada Rua do Sol, assim chamada apenas por ironia ou por mero capricho da toponímia, pois que os raios do astro rei só esporadicamente ali conseguem entrar" foi "ontem palco de um acontecimento que por invulgar e inesperado assumiu proporções de caso de sensação".
Estranhando o estabelecimento estar fechado, vizinhos e clientes alertaram um sobrinho, que chamou a PSP. A porta das traseiras foi estroncada e o corpo foi encontrado por aquele familiar ao fundo das escadas, com profundo golpe na garganta.
E, desde logo, a morte esteve rodeada de mistério, pois "nada de anormal transpirava na vida de Margarida Cepeda que pudesse vir a ser um prenúncio daquilo que agora aconteceu".
A riqueza da comerciante, traduzia-se em dinheiro - a maior parte nos bancos e algum em casa - e muitas e valiosas joias. Também se sabia que emprestava quantias "mais ou menos elevadas" a juros e sobre hipotecas, "pelo que tinha diversos devedores". E que havia desaparecido uma pulseira.
A Judiciária interrogou dezenas de pessoas, e chegou a deter "Um homem que talvez tenha (ou talvez não) alguma coisa a ver com o caso", titulou o JN.
"Desde o Infante à Rua do Sol, dos populosos bairros das Fontainhas, às imediações da Batalha, os agentes andaram numa roda viva atrás de sapateiros e engraxadores que conheciam a Sr.ª Margarida Cepeda ou eram seus clientes".
Mas foi Germano Silva a desvendar o crime. Durante uma conversa com o sapateiro Rogério este ausentou-se e o repórter aproveitou para passar os olhos por um poster com jogadores do FC Porto.
O papel engelhado não deixava ver um deles e quando Germano lhe tocou encontrou a pulseira roubada. "Fizemos um acordo com os agentes. Eu dizia onde estava a pulseira e eles prendiam o homem pelas 2 horas, para o fotógrafo aparecer e o jornal do dia seguinte surgir com a foto", contou Germano anos mais tarde.