Defesa do caso Russiagate diz que coima de mais de um milhão de euros “não é aplicável”
O advogado da Câmara de Lisboa no caso Russiagate, Tiago Félix da Costa, defendeu, em tribunal, que não é possível “aplicar a coima” de “um milhão e 250 mil euros” à autarquia por ter enviado os dados de três ativistas russos. A sentença deverá ser conhecida nas próximas semanas.
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Quase dois anos depois de a Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD) ter multado em mais de um milhão de euros a Câmara de Lisboa por ter, entre outras infrações, enviado os dados pessoais de ativistas russos anti-Putin à Embaixada da Rússia, a impugnação pela autarquia da contraordenação começou a ser julgada, esta manhã de sexta-feira, no Tribunal de Círculo Administrativo de Lisboa.
O advogado da autarquia, Tiago Félix da Costa, que esteve a ser ouvido durante uma hora no Campus de Justiça, explicou que o legislador europeu não estabeleceu critérios para aplicar coimas para entidades públicas e, por isso, não se pode aplicar uma pena sem esta estar estabelecida na lei.
“O legislador previu critérios que só têm aplicação direta para entidades privadas, não estou a ver como estes critérios se podem aplicar diretamente a um município ou a qualquer organismo público que não esteja integrado no setor empresarial do Estado”, afirmou em tribunal, alegando que “a lei não estabelece limites mínimos e máximos aplicados às coimas que possam ser imputadas às autoridades públicas, nem os critérios para estabelecer estas coimas”.
A defesa argumentou reiteradamente que o legislador “esqueceu-se de estabelecer em que medida é que se aplicam essas normas a entidades públicas” e que, ao aplicar uma pena não prevista, o tribunal estará "a violar o princípio do Estado de Direito".
Ainda segundo Tiago Félix da Costa, “a CNPD entende que é claro que as coimas (definidas na lei de proteção de dados pessoais) se aplicam às entidades públicas, mas depois desaplica as normas da lei da proteção de dados que estabelecem esses critérios”.
Em junho de 2021, os organizadores de uma manifestação de apoio ao opositor russo Alexei Navalny tornaram público que a câmara tinha enviado os seus dados pessoais para a embaixada russa em Lisboa. Descobriu-se, depois, que outros países, como Índia, Brasil, Estados Unidos, Israel, China e Angola também tinham recebido informações pessoais de manifestantes.
No total, a Câmara de Lisboa, liderada na altura por Fernando Medina, foi condenada a pagar 1,25 milhões de euros por 225 contraordenações, por ter enviado a terceiros dentro e fora da autarquia dados pessoais de organizadores de dezenas de manifestações em Lisboa, entre julho de 2018 e junho de 2021. Destas, 15 já prescreveram nos últimos meses, restando agora 210, referiu ainda Tiago Félix da Costa, esta manhã de sexta-feira, no Tribunal de Círculo Administrativo de Lisboa.
A magistrada informou ainda que a Câmara de Lisboa e a CNPD serão notificadas "oportunamente" da sentença, não sendo necessária a marcação de uma data para a sua leitura. Questionada pelo JN sobre quanto tempo demorará a ser conhecida a sentença, a defesa acredita que será nas próximas semanas.