Advogados do Conselho Geral assinam carta que acusa bastonário de não ajudar profissionais e repudia representação em evento de partido que quer "repor a tortura como sanção penal".
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Inoperância, centralismo e desinteresse pelas "dificuldades terríveis" de alguns advogados na crise pandémica. As críticas são apontadas ao bastonário, Menezes Leitão, no pedido de renúncia de seis membros do Conselho Geral da Ordem dos Advogados (CG/AO), incluindo o vice-presidente Rui da Silva Leal. O pedido foi dirigido ao Conselho Superior - que, anteontem, deliberou aceitá-lo - por carta que também serviu aos signatários para confessarem "muita vergonha" por a Ordem se ter feito representar, por dois dirigentes, no último Congresso do Chega, em setembro.
"Calámos, por lealdade ao senhor bastonário, a repulsa que nos causou saber, pela televisão, que a OA se fez representar no Congresso de um partido político que não reconhece direitos fundamentais universais e que quer repor a tortura como sanção penal", assumem os demissionários, com "muita vergonha perante todo o património cívico e civilizacional" que a OA herdou de "Salgado Zenha, Adelino da Palma Carlos, José Augusto Rocha, entre tantos".
Um assessor do bastonário disse ao JN que ele não comentava a carta, por ainda não ter sido notificado da deliberação do Conselho Superior. Acrescentou que a Ordem costuma fazer-se representar nos congressos de todos os partidos.
Reuniões insuficientes
Os demissionários são quase um terço dos 19 membros em funções no CG. Além do vice-presidente Silva Leal, demitiram-se os vogais José Rodrigues Lourenço, Madalena Alves Pereira, Paulo Pita Soares, Pedro Teixeira Reis e Tânia Lima da Mota. Na sua carta, defendem que, "ao fim de um ano de mandato, marcado por circunstâncias (desejavelmente) irrepetíveis de uma pandemia mundial, o CG não foi capaz de encontrar uma estratégia de resposta eficaz, atempada e coerente aos desafios brutais que se colocaram". "E, no entanto, vários membros do CG, designadamente os aqui signatários, propuseram, alertaram, sugeriram medidas de atuação", garantem.
Segundo dizem, "é manifesta a inoperância" do CG, que é presidido pelo bastonário e "tem reunido apenas uma vez por mês, da parte da manhã, quando a realidade se altera diariamente". Alegam que a própria Comissão Executiva, incumbida da gestão corrente, não se reúne desde 1 de julho de 2020. "Tudo é decidido" pelo bastonário e por mais "um ou dois, e sempre os mesmos", apontam, falando em "excessivo centralismo".
Os demissionários também contestam que a Ordem, ao mesmo tempo que oferecia a funcionários aumentos salariais, prémios e cabazes de Natal (ler ficha), tivesse recusado avançar para a "isenção do pagamento das quotas devidas à Ordem" desde o ano passado.
Sem defesas oficiosas
Segundo os demissionários, houve advogados que, "com muita dificuldade, em 2020, regularizaram o pagamento das quotas", para poderem fazer defesas oficiosas, pagas pelo Estado. Mas a inscrição neste sistema de acesso aos tribunais "após o termo do prazo" foi-lhes indeferida, apesar da "excecionalidade da situação social, económica e profissional" e "apesar da exposição dessa situação e dos insistentes apelos de alguns membros do CG", diz a carta, frisando que este órgão detém competência exclusiva para regular tais prazos.