Acusação descreve diversos episódios violentos em casa de acolhimento do Barreiro. Arguidos foram afastados de funções e serão julgados por maus-tratos.
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A ex-diretora técnica e o ex-psicólogo de uma casa de acolhimento de jovens em risco do Barreiro, pertencente à Cooperativa Rumo, vão em breve ser julgados por maus-tratos de dois rapazes de 15 anos ali institucionalizados. As vítimas foram alvo de espancamentos e insultos ao longo de um ano, entre 2016 e 2017. Num dos episódios descritos na acusação, os jovens foram forçados a calçar luvas de boxe e a lutar um contra o outro. Um deles chegou a dirigir-se à PSP para se queixar, mas foi surpreendido pelos arguidos na esquadra, levado para um descampado e agredido a soco.
O Ministério Público (MP) sustenta a acusação em vários casos em que Carla Santos, a diretora técnica, nascida em 1974, e Vladimir Pérez, o psicólogo, oito anos mais velho, terão infligido maus-tratos aos dois menores. O episódio do boxe ocorreu em novembro de 2017. Os jovens tinham-se portado mal na escola. E Vladimir, segundo o MP, "desferiu socos com uma luva de boxe nos dois e pontapeou um". "Ao outro deu um murro no peito. Depois, entregou as luvas de boxe aos dois e disse-lhes para lutarem". Carla Santos estava presente e também terá incitado à luta entre os jovens.
Vladimir é descrito na acusação como o mais ativo em quase todos os episódios de agressões. Um dos jovens foi agredido a murro por ter faltado às aulas e outro foi insultado por não ter tido uma aula de "luta olímpica" na escola. Depois, o psicólogo desafiou-o: "Queres luta? Eu dou-te a luta em casa".
A acusação também descreve um episódio em que Carla Santos esbofeteou um dos jovens porque este, depois de se ter aleijado a jogar futebol, disse um palavrão. Ao MP, a arguida alegou que estava de férias nesse dia.
Rumo fez denúncia ao Ministério Público
Na Páscoa de 2017, um dos menores foi à esquadra para apresentar queixa contra a diretora e o psicólogo da Rumo. Mas desistiu de fazê-lo, quando viu que aqueles dois aguardavam por si na esquadra. Foi então levado para um descampado e agredido. Com a assistência de Carla Santos, Vladimir desferiu pancadas na cabeça do jovem com os nós dos dedos e socos, causando-lhe lesões, acusa o MP.
A denúncia chegou ao MP em janeiro de 2018 pela Direção da Rumo, depois de uma funcionária denunciar o que se passava na casa do Lavradio junto dos dirigentes da cooperativa. Os suspeitos foram suspensos, em janeiro de 2018, quando a instituição abriu um inquérito interno, findo em maio desse ano com o despedimento por justa causa. As conclusões foram remetidas ao MP, que investigou e deduziu a acusação.
Defesa invoca "perfil problemático"
Depois de acusados, os arguidos pediram a abertura de instrução do processo, mas um juiz do Barreiro pronunciou-os pelos crimes descritos na acusação. A arguida Carla Santos tinha argumentado: "Para a descoberta da verdade, impõe-se ter em conta a personalidade dos jovens". Os rapazes maltratados foram descritos como tendo "uma natureza pessoal e perfil problemático", com processos disciplinares e criminais, pelo que a arguida pediu "uma perícia à sua personalidade". Mas o juiz de instrução concluiu que a personalidade dos jovens, conhecida pelo tribunal e descrita por testemunhas dos arguidos, não abalava "os fundamentos da acusação quanto à imputação que é feita aos arguidos". Por isso, já este ano, decidiu submetê-los a julgamento por crimes de maus-tratos a menores.
Pormenores
Cooperativa criada no Barreiro em 1981
A Rumo é uma cooperativa sem fins lucrativos, que funciona, desde 1981, desenvolvendo a sua atividade no Barreiro. Presta apoio em diferentes domínios, visando as "pessoas em situação de desvantagem" e a "promoção do direito à igualdade de oportunidades e à inclusão escolar, profissional e comunitária".
Apoio social em todas as idades
O acolhimento de menores em risco é uma das valências da cooperativa Rumo, que presta apoio a pessoas de todas as idades. Em 2021, nas comemorações do 40.º aniversário da Rumo, anunciou a criação de uma creche.