A EDP foi condenada a pagar três milhões de euros a cinco câmaras, por não ter partilhado receitas recebidas das empresas de telecomunicações que passam cabos nos postes da luz.
Corpo do artigo
Os postes, invocam os autarcas, são propriedade camarária e estão concessionados à EDP. Os contratos admitem que a elétrica rentabilize a infraestrutura - se a câmara concordar e for compensada. No global, poderão estar em causa uns 50 milhões de euros.
Os municípios, o Governo e a EDP estão numa relação difícil, a propósito do concurso para concessionar a rede de distribuição de eletricidade em baixa tensão. Mas a questão da repartição de receitas provindas das empresas de telecomunicações é antiga.
Cinco condenações
13951683
Em 2015, a Câmara de Gaia pediu a constituição de um tribunal arbitral que decidisse sobre a repartição do dinheiro que as empresas de telecomunicação pagam à EDP por passarem os cabos nos postes da luz. No ano seguinte, o tribunal condenou a EDP a entregar metade das receitas, ou seja, 461 mil euros, relativos aos anos entre 2005 e 2015, mais juros de mora. Acresce o correspondente a 2015 em diante.
Seguiram-se outras quatro câmaras: Santo Tirso, com 65 mil euros, e Alcácer do Sal, com 40 mil. E, mais recentes, Oliveira de Azeméis (800 mil) e Santa Maria da Feira (1,8 milhões). Valongo, Mealhada e Lourinhã estão a iniciar o processo, disse ao JN o advogado Vítor Coelho da Silva.
Perante os três primeiros acórdãos arbitrais, a EDP recorreu para o Tribunal Central Administrativo do Sul, que negou apreciar o caso porque as regras do tribunal arbitral excluem possibilidade de recurso. Depois, avançou para o Supremo Administrativo, que, nos dois acórdãos publicados este mês, manteve a decisão do Central. Ou seja, é válida a condenação dos tribunais arbitrais. Na sexta-feira, disse Vítor Coelho da Silva, a EDP pediu a nulidade do acórdão de Santo Tirso.
Lei obriga a autorização
Na argumentação apresentada a tribunal arbitral, as câmaras invocam a lei e o contrato de concessão, na parte em que obriga a EDP a obter autorização e negociar uma repartição de receitas se as infraestruturas (como os postes de eletricidade) forem usadas para outros fins que não o da concessão (distribuição de eletricidade em baixa tensão). Mas a EDP, asseveram, nunca pediu autorização nem propôs uma divisão de receitas. Aliás, dizem que a empresa escondeu a existência de contratos com operadoras de telecomunicações.
EDP diz não ter alternativa
A EDP contesta as decisões dos tribunais arbitrais e pediu a nulidade do acórdão do Supremo Administrativo sobre o caso de Santo Tirso (mas não de Gaia). Poderá, ainda, recorrer ao Tribunal Constitucional, admite Vítor Coelho da Silva. Está ainda pendente a decisão do Supremo relativa a Alcácer do Sal.
Ao JN, a empresa de energia sumarizou a argumentação: é obrigada por lei a disponibilizar as infraestruturas às empresas de telecomunicações e o valor cobrado destina-se a compensá-la por custos de "construção, manutenção, reparação e melhoramento das infraestruturas". Além disso, o valor "é abatido aos custos de exploração da rede, em benefício de todos os consumidores". Ou seja, não fica com o dinheiro.
Invoca ainda o "quadro legal e regulatório muito complexo" em que trabalha e que envolve reguladores como a ERSE (na energia) e a Anacom (nas telecomunicações). Por último, nota "algumas dissonâncias" entre a lei e os contratos de concessão que, diz, a levaram a recorrer das decisões arbitrais.
A Associação Nacional de Municípios não quis prestar esclarecimentos, invocando estar em curso a preparação do concurso público para a concessão que hoje está entregue à EDP.
E-Redes é antiga EDP
No início deste ano, a EDP Distribuição, visada nos processos movidos pelas câmaras, mudou de nome. Agora chama-se E-Redes.
Em julgamento, avançou Vítor Coelho Silva, a EDP disse ter uma receita de oito milhões de euros/ano. O JN perguntou-o à empresa, mas não teve resposta.